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Filmes Vistos em Abril - Parte 2

Presságio (Alex Proyas, 2009) 9/10

Com: Nicolas Cage, Chandler Canterbury, Rose Byrne, Lara Robinson, Nadia Townsend

Eu creio já ter mencionado anteriormente que filmes inclassificáveis tendem a ser os melhores. Presságio é um destes, e chega tanto para colocar um pouco de rumo na carreira titubeante de Nicolas Cage como para atestar a habilidade do diretor Alex Proyas, sumido desde que havia feito Eu, Robô em 2004.

Cage é o pai viúvo de um garoto (Chandler Canterbury) que um dia recebe na escola um presente inusitado: o "desenho" que uma menina fez há 50 anos como parte de uma celebração escolar realizada com as crianças da época. Circunstâncias levam-no a interpretar o desenho, que consiste de uma série de números que, aparentemente, profetizam todos os grandes desastres ocorridos desde a década de 50. Contar mais que isso é verdadeira sacanagem, acreditem em mim. Uma das coisas que me fez gostar ainda mais do filme foi a campanha de divulgação, já que o trailer em nada denuncia o que aguarda o espectador. A história gravita em torno do drama de pai e filho, mas oscila com maestria entre o horror, a ação, o suspense e a ficção científica. Além de conter um punhado de cenas impressionantes, Presságio toca em temas universais com uma eficiência marcante, caracterizando-se como um filme ateu e ao mesmo tempo cristão, o que por si só já é um grande motivo para elogios. O final é polêmico, do jeito que eu gosto, as únicas ressalvas sendo uma ou duas decisões nebulosas do roteiro que não chegam a tirar o brilho da obra. Que é facilmente subestimável, mas é fantástica e definitivamente digna de uma conferida.

Sweet Movie (Dušan Makavejev, 1974) 10/10

Com: Carole Laure, Anna Prucnal, Pierre Clémenti, Sami Frey, John Vernon

Por mais preparado que eu estivesse, já que eu fazia alguma idéia do que esperar deste marco do diretor iugoslavo Dušan Makavejev, a escatologia e a linguagem adotados no filme me surpreenderam. Na mesma verve dos trabalhos mais transgressores de Pasolini e do surrealismo metafórico de Buñuel ou Jodorowski, Makavejev concebe uma história que abala as estruturas das convenções sociais então vigentes do capitalismo e do socialismo, refletidos nas linhas narrativas que acompanham a tal miss Canadá (a belíssima Carole Laure) e a capitã de um barco mambembe (Anna Prucnal) que singra os canais de Amsterdam a esmo. Enquanto a canadense passa por mudanças inomináveis após entrar no concurso que a levará a se casar um um ricaço excêntrico (John Vernon), a capitã do barco se envolve com um marinheiro (Pierre Clémenti) e expõe um pouco dos doces segredos que seu barco esconde.

A visão de Makavejev tem ferrenhas origens políticas além de artísticas, e é preciso admitir que seu trabalho tem a capacidade inata de agredir as plateias mais puritanas ou conservadoras. O choque é evidente em vários níveis, da nudez sem firulas à interpolação das terríveis imagens da exumação dos corpos do massacre de Katyn. Mas nenhuma sequência é tão surpreendente quanto o banquete de uma comunidade estranha que se entrega à completa ausência de escrúpulos, sejam eles comportamentais ou higiênicos, enquanto um festival de vômitos, urina, talco e fezes corre solto. Mais estarrecedora que a orgia social é a alegria e o desprendimento com que os atores se entregam a ela (todos faziam parte de um grupo teatral dedicado a isso), uma característica que se estende ao restante do filme com uma naturalidade assustadora. O título não é Sweet Movie por acaso, e as conotações associadas são expostas num frenesi visual que jamais se detém por muito tempo no mesmo lugar. E como era de se esperar, nada é dado de bandeja para a interpretação do espectador.

Aos apreciadores do cinema sem amarras, informo que Sweet Movie é uma sessão nada menos que obrigatória!

La Noche de los Brujos (Amando de Ossorio, 1973) 4/10

Com: Simón Andreu, Kali Hansa, María Kosty, Jack Taylor, Loreta Tovar

A.K.A. The Night of the Sorcerers — Pouco depois de dirigir o que seria considerado o chamariz de sua relativamente curta filmografia (La Noche del Terror Ciego), Amando de Ossorio se arriscou em outra "noite" maldita com essa mistura maluca de bruxaria, vodu e vampirismo. As vítimas são um grupo de zoólogos que vai a uma floresta africana fazer pesquisa, mas é envolvido nas superstições locais sobre uma tribo de feiticeiros que se manifesta somente à noite para sacrificar mulheres e transformá-las em leopardos transmorfos. Bem, é mais ou menos por aí... As semelhanças da ameaça sobrenatural com a da série Blind Dead são gritantes, temática e cenograficamente falando. Este filme, porém, tem uma dose mais generosa de exploitation e aproveita com certa eficiência a beleza do elenco feminino, que só tem mulher bonita – para a alegria da plateia masculina. Há passagens inadvertidamente hilárias, como as das moças correndo seminuas pela floresta em câmera lenta somente com trajes de oncinha. O grande problema é que, sem saber o que fazer no desfecho da história, Ossorio acaba com tudo de forma estúpida e derivativa, perdendo a chance de deixar o filme memorável.

¿Quién Puede Matar a un Niño? (Narciso Ibáñez Serrador, 1976) 6/10

Com: Lewis Fiander, Prunella Ransome, Antonio Iranzo, Javier De La Camara, Maria Druille

A.K.A. Who Can Kill a Child? — Fábula tenebrosa onde um grupo de crianças se revolta contra a casta dos adultos de forma inclemente, este suspense obscuro e bizarro abandona o realismo e trilha um caminho de horror psicológico cuja força reside no contraste existente entre a graça natural e a pressuposta natureza homicida de uma criança, para todos os efeitos uma criatura inocente que jamais deve ser vítima de violência. A história se passa numa ilha, para onde vão um casal em férias (Lewis Fiander e Prunella Ransome). Demora um pouco para que eles percebam que todos os adultos do lugar sumiram, e que as poucas crianças que eles avistam guardam um segredo terrível. A longa introdução com todas aquelas cenas de crianças mortas ou afetadas por guerras estabelece de imediato o clima para o que está por vir, e não deixa por nenhum momento que a plateia se esqueça da razão primordial da história. O nível de interpretação do elenco ajuda a manter a tensão constante, e é interessante observar como Prunella Ransome lembra bastante Sissy Spacek. O filme é interessante como um ensaio cinematográfico extremo, mas não encontra muito respaldo fora da esfera fantástica em que se insere.

Yaneura No Sanpo Sha (Tanaka Noboru, 1976) 4/10

Com: Junko Miyashita, Renji Ishibashi, Hiroshi Cho, Aoi Nakajima, Toshihiko Oda

A.K.A. The Watcher in the Attic — Mais um pink-eiga saído dos prolíficos estúdios Nikkatsu, este "observador do sótão" é isso mesmo que o título entrega. Um desocupado meio estranho (Renji Ishibashi) passa seus dias a espionar os vizinhos de pensão por buracos no teto, em especial uma mulher (Junko Miyashita) que satisfaz suas taras sexuais com um palhaço. Com o tempo os dois se aproximam, descobrindo então que têm muitos estímulos bizarros em comum. A história deriva de vários contos de Edogawa Rampo, o Edgar Allan Poe japonês, e traz de brinde um dos fetiches mais exóticos que eu já vi: homem fascinado por mulher entra dentro de uma poltrona para senti-la através da superfície aveludada do móvel. No geral, o filme não convence por completo devido à falta de realismo na execução das ações dos personagens. O ritmo é lento, os diálogos são esparsos e a ambientação pende para o voeuyrismo surreal, o que demanda certa paciência por parte do espectador. Analisadas isoladamente, no entanto, muitas sequências são de fato bem feitas e marcantes. O final inesperado estabelece a época em que se passa a narrativa, servindo também como uma oportuna lição de história.

Meu Primo Vinny (Jonathan Lynn, 1992) 10/10

Com: Joe Pesci, Marisa Tomei, Fred Gwynne, Ralph Macchio, Mitchell Whitfield

Enquanto sua popularidade ganhava uma boa turbinada com o Oscar por seu papel em Os Bons Companheiros, Joe Pesci estrelou a seguir esta comédia excelente, que me passou batida no início da década de 90. Foi só agora que decidi dar uma chance a ela, graças em parte à presença de Marisa Tomei e ao Oscar que atriz coadjuvante que ela ganhou com este filme (comprei o DVD por impulso logo depois de sair da sessão de O Lutador). A história começa como uma hilariante comédia de erros, quando dois amigos em viagem (Ralph Macchio e Mitchell Whitfield) acabam indo parar na cadeia do caipira estado do Alabama, acusados erroneamente de homicídio. Entra em cena o primo advogado de um deles, Vinny (Pesci), uma mala sem noção alguma do que está fazendo que desembarca na cidade acompanhado da chamativa namorada (Tomei). Diálogos espertos, um roteiro bem amarrado e cenas antológicas são um prato cheio para quem gosta de comédias carregadas de estilo e protagonizadas por elencos competentes. Marisa Tomei está ótima, e cala a boca de quem chia por causa do Oscar que ela ganhou com méritos. O veterano Fred Gwynne, por sua vez, dá um verdadeiro show como o austero juiz do caso presidido por Vinny, em sua última participação no cinema antes de falecer. Meu Primo Vinny entra fácil em qualquer lista de melhores comédias dos anos 90, e é uma daquelas obras que imploram por uma continuação tão engraçada quanto. Só falta Pesci sair de sua aposentadoria.

Bôkô Kirisaki Jakku (Yasuharu Hasebe, 1976) 7/10

Com: Yutaka Hayashi, Tamaki Katsura, Yoko Azusa, Midori Mori, Rei Okamoto

A.K.A. Assault! Jack the Ripper — O título americanizado é uma piada. Não esperem nada de Jack "o estripador" neste pink movie violento e lascivo como poucos, a não ser a semelhança no modus operandi do(s) assassino(s). Considerado um dos trabalhos mais perversos e transgressores feitos no auge do movimento capitaneado pelos estúdios Nikkatsu, este filme não traz nada de redentor a respeito de seus controversos personagens: uma garçonete revoltada (Tamaki Katsura) e o confeiteiro de um restaurante (Yutaka Hayashi) que certo dia descobrem um gosto anormal e incomum pelo sangue alheio, lançando-se numa campanha de assassinatos para turbinar a sua vida íntima. A arma do crime é a espátula que o cara usa para modelar seus bolos, e o alvo físico nas mulheres capturadas é, bem... Deixo para a plateia descobrir! O diretor Yasuharu Hasebe imprime um ótimo ritmo, ditado pelas boas interpretações do elenco e por rompantes de sexo que se intercalam perigosamente com o sangue dos assassinatos. A seleção musical nestes momentos é de um contraste quase doentio (toca até bossa nova!), o que neutraliza um pouco o grau de choque que obviamente emana da narrativa. O filme não é para todo tipo de espectador, mas para quem aprecia o gênero o resultado está acima da média, justificando plenamente o hype de subversivo que a obra possui.

Tristana - Uma Paixão Mórbida (Luis Buñuel, 1970) 8/10

Com: Catherine Deneuve, Fernando Rey, Franco Nero, Lola Gaos, Jesús Fernández

Dez anos depois de fazer Viridiana, Buñuel volta a um terreno parecido com Tristana. A nova protagonista (Catherine Deneuve) é uma moça órfã tutelada por um aristocrata decadente (Fernando Rey, o bode velho favorito do diretor espanhol) que acaba sendo coagida a se tornar amante de seu benfeitor. A situação vai ficando cada vez mais insustentável até o dia em que ela conhece um artista de outra cidade (Franco Nero), o que irá incentivá-la a se desvencilhar da prisão em que vive. Opressão, obsessão e subversão de papéis convivem em mais um caldeirão de relacionamentos onde a moralidade masculina é enaltecida e ultimamente humilhada, à medida em que Tristana atravessa as várias fases de sua vida. Buñuel cria uma expectativa bastante específica para depois quebrá-la de forma quase cruel - o amor dá lugar ao egoísmo e a indiferença entra sorrateira onde somente havia virtude. Existem várias formas de se interpretar o conteúdo do filme, mas nenhuma delas é tão contundente quanto a visão amarga de que o processo de amadurecimento afeta cada um à sua maneira, e que experiência nem sempre significa sabedoria. Catherine Deneuve tem ótima atuação, na minha opinião mais expressiva que no clássico A Bela da Tarde.

Evocando Espíritos (Peter Cornwell, 2009) 7/10

Com: Virginia Madsen, Kyle Gallner, Martin Donovan, Elias Koteas, Amanda Crew

De vez em quando dá para acreditar que existe vida no cinema de horror norte-americano, bem de vez em quando. Evocando Espíritos é um desses casos, um filme que apesar das falhas é competente naquilo em que se propõe a mostrar: mais uma história de casa mal-assombrada. Na mesma linha dos clássicos à la Amityville Horror, o personagem central é um casarão sinistro para onde se muda uma família em situação desesperadora, tanto econômica quanto emocionalmente, já que o filho adolescente (Kyle Gallner) está em estágio avançado de tratamento contra um câncer. Ele é quem começa a ver aparições tenebrosas nos vários cômodos da casa, mas inicialmente se recusa a compartilhar isso com a família, em especial sua mãe (Virgina Madsen). Alegadamente baseado em fatos reais que hoje ninguém mais sabe se aconteceram ou não, a verdade é que a história tem desenvolvimento decente o suficiente para garantir bons momentos de tensão e suspense. O desempenho em cena do novato Kyle Gallner é digno de nota, valorizando o trabalho do elenco em geral. E quem é que não se animaria com uma das primas mais gatas (Amanda Crew) a darem as caras num longa do tipo? Anotem o nome da moça, ela ainda vai fazer muita gente se apaixonar por ela em seus trabalhos futuros!

Anjos da Noite - A Evolução (Len Wiseman, 2006) 6/10

Com: Kate Beckinsale, Scott Speedman, Tony Curran, Derek Jacobi, Bill Nighy

Apesar de ter perdido muito da força nesta revisão caseira, Anjos da Noite - A Evolução ainda consegue se elevar acima do primeiro filme em todos os aspectos possíveis. O roteiro é simples e não oferece muitas arapucas ou deixa as coisas tão sem explicação, permitindo que a narrativa se concentre quase que exclusivamente na ação, que é bastante ambiciosa e praticamente elimina conotações com o gênero ao qual vampiros e lobisomens originalmente pertencem. Os efeitos especiais são ótimos e o tom gótico continua bastante expressivo. A "romantização" dos personagens, por assim dizer, é algo que pode não agradar aos fãs mais radicais, mas com o tempo acabou ganhando força e até mesmo personificações para o público adolescente (ahn... Crepúsculo?). Admito que o que me atrai mais a atenção neste caso é Kate Beckinsale, com toda a certeza uma das vampiras mais belas já colocadas em celulóide. Para ficar perfeito mesmo só faltou aquele adorável sotaque inglês original que a moça tem!

Divagações postadas por Kollision de 25-ABR a 1-MAI de 2009