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Filmes Vistos em Março - Parte 1

Bravura Indômita (Joel e Ethan Coen, 2010) 9/10

Com: Hailee Steinfeld, Jeff Bridges, Matt Damon, Barry Pepper, Josh Brolin

Quando gente do calibre dos irmãos Coen decide refilmar um clássico do faroeste, podem ter certeza de que algo muito especial está em andamento. Eu não assisti ao Bravura Indômita original (Henry Hathaway, 1969), então não posso tecer comentários comparativos sobre os dois filmes. Os Coen declararam que foram mais fiéis à obra literária na qual ambas as obras se baseiam e, numa época em que o gênero está 100% morto, esta nova versão ganha um destaque ainda maior por ter conseguido inúmeras indicações ao Oscar de 2011. A história gira em torno de uma garota de 15 anos (Hailee Steinfeld) que quer se vingar do assassino do pai, e para isso contrata um xerife beberrão e aposentado (Jeff Bridges) para persegui-lo. No caminho, eles se unem a um patrulheiro texano (Matt Damon) que também está atrás do infeliz. Belissimamente fotografado, o filme dos Coen é de uma corpulência que fazia falta ao cinemão, um western puro, movimentado e, acima de tudo, divertido. Reunindo-se aos cineastas após a experiência de O Grande Lebowski, Jeff Bridges foi indicado ao Oscar de melhor ator por seu papel, mas quem dita o ritmo da história é mesmo a srta. Steinfeld. A veia incisiva dos Coen é diluída ao longo da narrativa em pitadas de humor que funcionam muito bem, ganhando mais espaço somente no desfecho melancólico.

O Ritual (Mikael Håfström, 2011) 4/10

Com: Colin O'Donoghue, Anthony Hopkins, Alice Braga, Ciarán Hinds, Rutger Hauer

É triste quando um filme começa de forma tão promissora e desaponta completamente assim que chega à reta final. No início, O Ritual passa a impressão de vai dar uma nova cara às histórias de exorcismo. Parece que houve uma espécie de conflito entre o potencial macabro criado na primeira metade da história e o desejo de manter uma esfera de ceticismo em meio às manifestações demoníacas. David (Colin O'Donoghue) foi criado pelo pai (Rutger Hauer) para sucedê-lo no peculiar ramo de necrotério, mas nunca quis essa vida ou a vida de padre. Prestes a abandonar o curso presbiterial, ele é convencido a ir a Roma para conhecer os ensinamentos sobre a arte do exorcismo. Sua descrença será bombardeada quando ele passa a acompanhar a rotina de um padre exorcista nada ortodoxo (Anthony Hopkins) que luta para expulsar o demônio do corpo de uma moça grávida. Acredito que o maior erro do filme foi alterar o foco de um personagem para outro no meio da história, provavelmente para justificar a presença de Hopkins no elenco, porém isso quebra a construção de tensão de forma insatisfatória. Alice Braga tem uma considerável mas apagada participação, e é uma pena que Rutger Hauer tenha tão pouco tempo em cena. Dono de um bom tino estético, só falta mesmo o diretor sueco Håfstrom pegar um roteiro que tenha mais consistência para fazer um filme de horror realmente eficiente.

O Discurso do Rei (Tom Hooper, 2010) 8/10

Com: Colin Firth, Geoffrey Rush, Helena Bonham Carter, Guy Pearce, Michael Gambon

George VI foi o rei da Inglaterra durante o período mais conturbado do país no século 20. Ele escreveu parte da história da nação, mas não sem lutar contra um problema pessoal que lhe afligiu durante a maior parte da vida: a gagueira. O Discurso do Rei, ganhador dos Oscars de melhor filme, direção, ator e roteiro original, retrata esse peculiar aspecto da trajetória do rei Albert/George (Colin Firth), iniciando pelo período em que ele conhece Lionel Logue (Geoffrey Rush), um terapeuta da fala que o ajuda a superar o problema. O filme culmina no discurso de Setembro de 1939, que conclamou os povos sob o domínio britânico a entrar em guerra contra a Alemanha. Sem em nenhum momento ostentar o estigma de "drama de Oscar", o filme é muito interessante e até mesmo bem-humorado em sua caracterização da realeza inglesa. Não há dúvidas de que a dupla Firth e Rush brilha ao longo de toda a história, compondo um relacionamento marcado por uma amizade improvável, que conferiu um senso de humanidade absolutamente inesperado a um monarca austero. Pelo que o filme mostra, quase dá para compreender a importância prática de um sistema político monárquico, mesmo sem ser inglês. Se é que vocês me entendem.

O Besouro Verde (Michel Gondry, 2011) 8/10

Com: Seth Rogen, Jay Chou, Christoph Waltz, Tom Wilkinson, Cameron Diaz

Revendo o filme apenas umas poucas semanas depois de tê-lo assistido pela primeira vez, vou dar uma opiniões rápidas sobre o elenco. Seth Rogen: o cara coloca muito de si mesmo no papel do Besouro Verde; é o tipo de figura com o qual muitas pessoas se identificam, o que humaniza o personagem apesar das coisas impossíveis que se propõe a fazer e das idiotices que ele faz. Irritante? Não para esse estilo de filme. Jay Chou: é mais ou menos óbvio que o cara não fala inglês direito, mas ele tem boa presença em cena e se quiser pode até mesmo se dar bem em comédias. Cameron Diaz: não gosto dela, e ponto final; para mim ela apareceu e desapareceu em O Máskara, e só. Christoph Waltz: hilário; um ótimo ator, bem escalado para o papel do vilão; algumas das tiradas que ele dispara são fantásticas, como as menções ao Popeye. David Harbour: ele me lembra o Roger Bart, não fede nem cheira. Tom Wilkinson: se precisarem de um cara que transpire austeridade ou seriedade, chamem Wilkinson. Edward James Olmos: um ator que há tempos eu não via, parece ter envelhecido bem; gostaria de vê-lo em papeis de maior destaque. Curiosidade: foi só depois de assistir pela primeira vez e me informar que descobri que o dono dos laboratórios de manipulação de drogas do filme, que aparece durante uma breve e hilária sequência, é na verdade Edward Furlong, o John Connor de O Exterminador do Futuro II.

Kick-Ass - Quebrando Tudo (Matthew Vaughn, 2010) 9/10

Com: Aaron Johnson, Chloe Moretz, Christopher Mintz-Plasse, Nicolas Cage, Mark Strong

Kick-Ass, o filme, funciona basicamente por causa do elenco bem escalado. Isso é fato. Analisando-o mais friamente, talvez o menos adequado seja Nicolas Cage. Não que ele não faça seu papel como deveria, mas talvez porque ele é o único que não se encaixa dentro da geração de atores presentes na história, e o estilo do herói que ele interpreta seja derivado de um grande ícone do gênero. Sobre Chloe Moretz, é difícil não se apaixonar por ela depois de vê-la em ação. Desde que vi Kick-Ass pela primeira vez assisti outros filmes em que ela aparece em papeis pequenos (como Regresso do Além e O Olho do Mal). Por mais que seja difícil admitir, é óbvio que Christopher Mintz-Plasse terá muita dificuldade para deixar para trás o estigma de McLovin - o futuro dele no cinema será provavelmente muito doloroso, mas ele permanecerá em evidência enquanto a fonte de Kick-Ass não secar.

Esta revisão serviu para esclarecer minha dúvida sobre a capacidade de Kick-Ass levar porrada. Sim, ele recebe uma série de implantes metálicos no corpo quando vai parar no hospital pela primeira vez. Mas isso não deu a ele nenhum fator de cura, deu?

O Visitante (Robby Henson, 2006) 3/10

Com: Martin Donovan, Edward Furlong, Kelly Lynch, Randy Travis, Richard Tyson

Quando a esmola é muita suspeita-se do santo. Tal máxima é basicamente o calcanhar de Aquiles de O Visitante, mais um terror de cunho apocalíptico que não consegue se sobressair em meio às inúmeras obras já feitas sobre o tema. De um lado está o pastor (Martin Donovan) que perdeu a fé e abandonou a congregação depois do assassinato brutal da esposa. Do outro está um rapaz (Edward Furlong) que começa a fazer milagres de cura e arregimenta uma multidão de seguidores. Não é somente o pastor que começa a ter visões estranhas, mas é ele quem finca o pé no ceticismo e passa a questionar os fenômenos, ao lado de uma médica veterinária que acaba de se mudar para a cidade (Kelly Lynch). O Visitante é carente de surpresas que façam a história sair do ponto morto, e as poucas cenas com um mínimo de tensão acabam se restringindo ao clímax previsível. Além disso, a explicação dada para a relação entre eventos passados e futuros praticamente anula a maior parte da trama, o que deixa a história sem sentido. Fraco, o filme talvez valha pelo elenco de gente que já esteve em evidência no passado mas anda meio sumida hoje em dia.

Tropa de Elite (José Padilha, 2007) 10/10

Com: Wagner Moura, Caio Junqueira, André Ramiro, Milhem Cortaz, Fernanda Machado

Acho que foi somente depois desta revisão, feita após uma sessão da ótima continuação, que percebi algo que não parece muito evidente dado o falatório em torno do bafafá envolvendo o Capitão Nascimento, personagem icônico feito por Wagner Moura. O protagonista da história não é bem Nascimento, mas sim um de seus protegidos. Nascimento tem um arco definido logo que o filme começa, mas o mesmo não pode ser dito daquele que deve substituí-lo, um de dois melhores amigos que ingressam no Bope ao mesmo tempo (Caio Junqueira e André Ramiro). A ideia de que Nascimento é um super-heroi, de fato adequada ao segundo longa, também não se aplica aqui, uma vez que ele está fragilizado por ataques inconstantes de estresse minimizados por medicamentos que nunca são explicitamente discriminados. Independente do posicionamento da plateia (a favor ou contra os métodos do Bope), a discussão suscitada pelo filme conduz a um círculo vicioso que somente pode ser quebrado quando pessoas como os mocinhos da história se dispõem a fazer algo para mudar o sistema, mais ou menos como ocorreu recentemente no violento episódio da pacificação do Complexo do Alemão. Só para constar, eu sou a favor. Missão dada é missão cumprida, e bandido bom é bandido morto.

Hellraiser - Renascido do Inferno (Clive Barker, 1987) 8/10

Com: Ashley Laurence, Andrew Robinson, Clare Higgins, Sean Chapman, Doug Bradley

Quando foi lançado, Hellraiser foi alardeado com uma renovação no cinema de horror. O diretor, roteirista e escritor Clive Barker foi alçado a sucessor de Stephen King, e isso pelo próprio. A história demonstra que isso não é bem verdade, mas mesmo assim Hellraiser continua sendo um bom terror de orçamento modesto: um filme que fez bem ao criar uma mitologia própria sólida, com considerável potencial para o macabro e o profano. O "renascido do inferno" em questão é um mistério que se esconde no sótão da casa para onde se muda um casal (Andrew Robinson e Clare Higgins). Ela esconde um segredo nada inocente, e a filha dele de outro casamento (Ashley Laurence) vem a se transformar na principal oponente dos cenobitas, forças do mal que se levantam para provocar dor e sofrimento àqueles que se atrevem a desvendar um quebra-cabeças que abre as portas do inferno. Para um diretor de primeira viagem, Barker faz um trabalho fenomenal durante pouco mais da metade do filme, apoiado por um trabalho de maquiagem e efeitos especiais de primeira linha. Mesmo com um final meio capenga e algumas atuações visivelmente amadoras (culpa de Barker, principalmente no caso da bela Ashley Laurence), o filme estabelece muito bem as figuras do cenobitas, dos quais o mais famoso é Pinhead, o carecão com pregos na cabeça - uma das imagens mais fortes e imponentes do cinema de horror dos anos 80.

Texto postado por Edward em 15 de Março de 2011