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Filmes Vistos em Março - Parte 1

Kyôfu Joshikôkô - Bôkô Rinchi Kyôshitsu (Norifumi Suzuki, 1973) 5/10

Com: Miki Sugimoto, Reiko Ike, Seiko Saburi, Misuzu Oota, Jun Midorikawa

A.K.A. Terryfing Girls' High School - Lynch Law Classroom – Segundo filme da série conhecida no ocidente como Terrifying Girls' High School e estandarte do sub-gênero do pink violence, este trabalho é mais uma amostra da mente agradavelmente pervertida de Norifumi Suzuki. Apesar de não estar no mesmo nível de um Sukeban Gerira (Girl Boss Guerrilla) ou Seijû Gakuen (School of the Holy Beast), Lynch Law Classroom esbanja escatologia semi-erótica enquanto destila a mesma historieta rala de sempre. Miki Sugimoto é uma das três delinqüentes que vai parar numa escola destinada a recuperar moças rebeldes, como pretexto para investigar a morte de uma amiga no lugar. Ela inicia um levante contra a sádica casta de alunas dominantes, que age impune com o aval da diretoria e da polícia (!). É uma pena que a formosa Reiko Ike entre em cena somente depois da metade do filme, com a motivação mais estapafúrdia possível – e sem nenhuma contribuição no departamento do guilty pleasure. Mais indicado para os fãs hardcore de Suzuki ou dos pink violence ../../movies em geral, esta obra menor não deixa de ser uma diversão desleixada e inconseqüente com sua mistura de crítica social azeda, violência, tortura e erotismo.

Rambo IV (Sylvester Stallone, 2008) 7/10

Com: Sylvester Stallone, Julie Benz, Matthew Marsden, Graham McTavish, Paul Schulze

E lá se vão 20 anos desde que o brucutu John Rambo deu uma mãozinha aos afegãos contra os russos malvados, no então ultra-violento Rambo III. O que mudou de uma aventura para a outra? Não sei se é motivo de alegria ou não, mas a única coisa diferente é o nível gráfico da violência, de um realismo e brutalidade avassaladores. O resto continua todo lá: do vilão completamente unidimensional ao infalível tema do resgate de prisioneiros e da guerra de um homem só (ou não tão só desta vez). Relutantemente, o personagem aceita acompanhar um grupo de missionários até uma Birmânia destruída pela guerra civil, apega-se à líder do grupo e vai em sua ajuda quando eles são dados como perdidos. O contraste entre o velhão bombado e uma nova geração de brucutus mercenários poderia ter sido mais bem explorado. Porém, naquilo que interessa, que é a ação adrenalinesca em sua forma mais crua, o filme não desaponta mesmo as mais elevadas expectativas. História rasa, sim, senhor, mas tentem encontrar um filme que, atualmente, faz você se mexer na poltrona e proferir um quase involuntário “car#%ho” umas três ou quatro vezes durante a projeção.

O Caçador de Pipas (Marc Forster, 2007) 8/10

Com: Khalid Abdalla, Homayoun Ershadi, Zekeria Ebrahimi, Ahmad Khan Mahmidzada, Shaun Toub

A história de O Caçador de Pipas é clássica no sentido mais literal do termo. Um romance que envolve duas gerações e discorre sobre a intolerância e a amizade transcendental em meio a um dos mais conturbados cenários sociais da era moderna. Os personagens centrais do drama são dois meninos radicalmente diferentes entre si, que no entanto partilham um forte vínculo de amizade no Afeganistão da década de 70. Um evento trágico causa uma grave ruptura em suas vidas e, já no final dos anos 90, nos EUA, um deles se vê obrigado a retornar ao país de origem para tentar fazer as pazes com seu passado, num ambiente dominado pela intolerância aplicada pelos talibãs radicais.

Não li o livro. Porém, parte da força desta adaptação cinematográfica parece de fato advir de sua origem literária. O outro fator que faz o filme funcionar é o elenco, que unanimemente incorpora com sagacidade e inteligência as sutilezas de uma cultura incompreendida por muitos. Com uma fotografia excelente e ótimo uso dos cenários desérticos, o longa ganha uma alma que parece estar além daquilo que o diretor Marc Forster costuma imprimir em seus trabalhos, numa história que heroicamente não apresenta meandros melodramáticos.

Antes de Partir (Rob Reiner, 2007) 9/10

Com: Jack Nicholson, Morgan Freeman, Sean Hayes, Beverly Todd, Rob Morrow

Em seus melhores dias, o versátil Rob Reiner é capaz de dirigir pérolas como Conta Comigo. Porém, ultimamente, ele tem metido os pés pelas mãos feio (Dizem por Aí é um desastre). O que fazer então para se recuperar? Que tal convocar duas lendas vivas do cinema norte-americano e retornar à familiar verve de seus melhores trabalhos?

Mesmo com aquela sensação de “já vi isso em algum lugar” em mente, fica difícil resistir à idéia de assistir a Jack Nicholson e Morgan Freeman contracenando numa história sobre o canto do cisne de dois homens condenados à morte pelo câncer, que se tornam amigos num quarto de hospital e decidem preencher as lacunas de suas vidas em grande estilo antes de baterem as botas. Pode-se dizer que o filme não faz força alguma para fugir dos clichês, mas é inegável a competência com que as agruras e imperceptíveis nuances de comportamento dos dois bodes velhos são capturadas pela narrativa, que só melhora à medida em que se aproxima de seu final. Nicholson mais uma vez prova que é um monstro de sua geração, enquanto Freeman não se furta a reencarnar o ancião contido e sábio. Um verdadeiro show de bola, com a obrigatória mensagem e um ótimo balanço entre comédia e drama.

Onde os Fracos Não Têm Vez (Ethan Coen e Joel Coen, 2007) 7/10

Com: Josh Brolin, Javier Bardem, Tommy Lee Jones, Woody Harrelson, Kelly Macdonald

O ocaso de gerações já ganhou muitas representações ao longo da história do cinema. Algumas contundentes, algumas fracas e outras como esta epopéia de violência dos irmãos Coen. Interpretá-la parece ser tarefa difícil, ou talvez isso seja apenas a idéia que os Coen querem que façamos de seu filme, pura e simplesmente. O que dizer, afinal, de um homem (Josh Brolin) que encontra uma maleta de dinheiro em meio a uma chacina no deserto e passa a ser perseguido por um psicopata homicida (Javier Bardem), enquanto um policial prestes a se aposentar (Tommy Lee Jones) segue uma rotina que apenas remotamente poderá levá-lo a se encontrar com o assassino?

Tem gente capaz de encontrar certa profundidade na história - que se passa em 1980 - discorrendo sobre o modo como um novo tipo emergente de violência afeta aqueles que, assumidamente, estão no topo de uma cadeia social em constante evolução. Sobre como as similaridades entre o novo e o velho se chocam num conflito cujo desfecho é inevitável. Enquanto cinema, policial e suspense, a execução principal é uma demonstração impressionante de técnica. O resultado geral, no entanto, é maculado por um trecho final decepcionante, desinteressante e verborrágico. Nada que justifique um Oscar de melhor filme.

Em tempo: achei o personagem de Javier Bardem praticamente uma nova versão do psicopata de Rutger Hauer em A Morte Pede Carona, clássico dos anos 80.

O Olho do Mal (David Moreau e Xavier Palud, 2008) 5/10

Com: Jessica Alba, Alessandro Nivola, Parker Posey, Rachel Ticotin, Rade Serbedzija

Se você é fã de Jessica Alba e, bem, sabe tanto quanto eu como as câmeras costumam se enamorar de sua atraente imagem, então é possível que você consiga assistir a esta refilmagem de The Eye - A Herança (Pang Brothers, 2002) sem fazer uma cara muito feia. Mais uma vez, a redundância é o resultado de mais esta empreitada desnecessária, que tenta desesperadamente agregar alguma coisa ao material original com o uso exagerado de efeitos especiais. A premissa, ainda bastante eficiente, é a mesma: moça cega recebe um novo par de córneas num bem-sucedido transplante, mas passa a enxergar tanto os vivos quanto os mortos. Junta-se a isto sustos ocasionais, diálogos nem sempre bem encaixados e uma representação inutilmente agressiva dos seres do além. Para quem viu o original, é perda de tempo. Para quem não viu, talvez valha a pena arriscar.

A Noite dos Mortos Vivos (George Romero, 1968) 8/10

Com: Duane Jones, Judith O'Dea, Karl Hardman, Marilyn Eastman, Keith Wayne

Divisor de águas do terror cinematográfico, A Noite dos Mortos Vivos foi o filme que definiu a vertente mais tétrica do gênero mais marginalizado da história do cinema, apesar de não ter sido a primeira obra sobre zumbis. Chocante para a sua época – e levemente datado em relação aos dias atuais – o filme é um triunfo do cinema independente de baixo orçamento. A produção era tão pobre que um dos seus atores principais era o próprio produtor Karl Hardman (ironicamente o melhor em cena), a trilha sonora reaproveitava músicas de domínio público usadas à exaustão em filmes anteriores e a mixagem de som tinha uma dificuldade absurda em interpôr diálogos e música. Nada disso, porém, chega a afetar o impacto resultante do conto que mostra um grupo de pessoas preso numa casa enquanto mortos-vivos tentam devorá-los por todos os lados.

Acredito que as nuances de crítica social que com o tempo vieram a ser depositadas sobre a série de zumbis de Romero se fundamentam nesta primeira parte da série mais que em todas as outras, particularmente devido à reação da crítica da época. Há quem tenha visto farpas sobre o racismo na figura do protagonista (o ator negro Duane Jones), e há quem associe os zumbis à inexorável marcha do capitalismo, sem contar a revolta de muitas classes devido ao exagero gráfico de certas cenas. Cinematograficamente falando, o maior mérito do longa é demonstrar uma leve herança do horror clássico praticado por estúdios como a Universal (o primeiro zumbi é visivelmente inspirado em Frankenstein e trechos musicais remetem aos pastiches clássicos da década de 30, sem contar a fotografia em preto-e-branco), enquanto ao mesmo tempo empurra os padrões vigentes da época para além de seus limites.

Divagações postadas por Kollision entre 14 e 17 de Março de 2008