Bastardos Inglórios (Quentin Tarantino, 2009)
Com: Brad Pitt, Christoph Waltz, Mélanie Laurent, Diane Kruger, Daniel Brühl
Há uma cena em especial em Bastardos Inglórios que me chamou a atenção mais que as outras. Trata-se do momento em que um personagem-chave falha miseravelmente em sua missão graças à magia do cinema. É um momento singular, porque nem se trata tanto da qualidade do que estava sendo exibido na tela grande, e sim do fato daquelas imagens estarem sendo simplesmente projetadas numa tela grande. Só isso. Temos então uma representação sutil, embora violenta e deslocada em tema e forma, da força que o cinema possui como meio de propaganda e motivação. Acima de tudo, uma declaração oblíqua de amor à sétima arte, suscitada em meio a um dos cenários mais improváveis para tal: um cinema que exibe um filme nazista durante a ocupação alemã na França de 1944.
Quentin Tarantino é um cara que prossegue refinando seu método de maneira espetacular. O cara sabe como ninguém reciclar influências de gêneros surrados pela crítica de modo a apetecer o público mais abrangente, imprimindo um senso de estilo de encher os olhos (e a mente). Seus trabalhos cada vez mais apresentam uma assinatura inconfundível, e Bastardos Inglórios prossegue a tendência ao praticamente fundir os conceitos clássicos do western com os filmes de guerra, da técnica à trilha sonora, da narrativa à encenação da violência. Há uma galeria de personagens memoráveis, dentre os quais se destacam o ardiloso coronel alemão caçador de judeus (Christoph Waltz) e a judia cuja família foi massacrada e mais tarde tem a chance de retribuir o sofrimento (Mélanie Laurent). Brad Pitt é o líder de um esquadrão secreto de judeus americanos cujo único objetivo é assassinar e escalpelar o maior número possível de nazistas na França ocupada. O grupo vê a oportunidade de acabar com a guerra quando Hitler e seus assessores mais importantes se reúnem para a estréia de um filme nazista em Paris, contando com o auxílio de uma atriz alemã (Diane Kruger) que é contra a ascensão do 3º Reich.
Sendo um longa de ficção que pega carona na história, falado em partes iguais de alemão, francês e inglês, Bastardos termina sendo um exercício fascinante ao estilo "o que aconteceria se", na maior parte um suspense que utiliza muito bem o senso geral de vingança suscitado pelo grupo de caçadores de nazistas. Tal qual o clássico Watchmen de Alan Moore, os únicos pontos de intersecção entre filme e realidade são os personagens e eventos históricos, o que resulta num retrato ácido, por vezes amargo e quase sempre incrivelmente engraçado de um período negro da história da humanidade. Imperdível.
Gamer (Mark Neveldine e Brian Taylor, 2009)
Com: Gerard Butler, Michael C. Hall, Amber Valletta, Kyra Sedgwick, Logan Lerman
Eu não gosto de First Person Shooters. Até respeito quem gosta, mas eu simplesmente não consigo jogá-los e morro de tédio vendo alguém jogar um. O que dizer então de um filme que é praticamente uma adaptação de Counter Strike? E tem mais! Jogue no meio da história um troço na veia de Second Life ou The Sims, outro gênero que me dá pavor, e temos uma das mais indigestas saladas de ficção científica já criadas nos últimos anos. É num universo assim que o condenado à morte feito por Gerard Butler vive, como o personagem de um jogo de vida e morte que é controlado por outra pessoa por meio de uma espécie de chip implantado em seu cérebro. As disputas são transmitidas mundialmente e ele precisa sair vivo 30 vezes para ganhar a liberdade, o que não fica bem nos planos do criador da tecnologia, um yuppie insuportável (Michael C. Hall) que esconde um segredo nefasto. Ah, esqueci de dizer que o pastiche é também derivativo de Corrida Mortal e Matrix!
Não existe senso de ritmo na narrativa. Tudo é atropelado, sem qualquer caracterização decente de personagens. Com exceção de Butler (mal e porcamente), nenhum outro personagem inspira empatia. Um verdadeiro desastre, coisa que era de se esperar da equipe que fez o também insuportável Adrenalina. Em tempo: eu não sabia que a direção era de Neveldine/Taylor até os créditos subirem. Se soubesse, teria passado meu tempo vendo grama crescer.
Stardust - O Mistério da Estrela (Matthew Vaughn, 2007)
Com: Charlie Cox, Claire Danes, Michelle Pfeiffer, Robert De Niro, Mark Strong
É uma pena que um filme como este tenha passado completamente despercebido nos cinemas, inclusive de mim. A culpa é completamente das cabeças pensantes (ou não?) por trás do marketing e da distribuição, que venderam Stardust como um conto de fadas bobo e infantil – que outra impressão é possível ter quando se olha, por exemplo, a capa do DVD? O que me atraiu ao filme, no final das contas, foi saber que ele é baseado numa obra de Neil Gaiman. Claire Daines faz o papel de uma estrela (sim, no sentido literal do termo) que cai na Terra graças à maldição de um rei moribundo (Peter O'Toole) que quer escolher dentre um de seus traiçoeiros herdeiros aquele que irá sucedê-lo. Eles têm que recuperar um rubi que esté em posse da "estrela", mas ela também se torna objeto de desejo de um rapaz sonhador (Charlie Cox) que deseja levá-la como prova de amor àquela com quem quer se casar (Sienna Miller). A era é a Idade Média, mas a presença de magia é algo normal num universo habitado ainda por uma bruxa malvada (Michelle Pfeiffer) e um pirata voador (Robert De Niro, surpreendentemente excelente num papel inesperado). Movimentado, ágil, romântico e engraçado, Stardust é ótimo divertimento. Não se deixe enganar pelo cartaz bobo ou pelo aspecto infantilóide do pacote.
Encarnação do Demônio (José Mojica Marins, 2008)
Com: José Mojica Marins, Jece Valadão, Rui Resende, Milhem Cortaz, Adriano Stuart
Uma grande piada.
Encarnação do Demônio é uma grande piada. Revendo-o agora é possível notar melhor quão vazia e inútil é esta finalização da "trilogia" imaginada por José Mojica Marins na década de 60. Com exceção do fator mulher pelada e da presença de Jece Valadão (ótimo), tudo nesta obra á praticamente um desastre. Os diálogos são indecentes, a história é um horror, a trilha sonora é um zero e as atuações, principalmente a de Mojica, são atrozes. Um dos produtores ou colaboradores deveria ter tido culhões e falado pro cara que não é assim que se faz bom cinema de horror hoje em dia.
E sabem o que é mais engraçado? É que há um desfile de sósias involuntários no filme! Mário Lima, colaborador habitual de Mojica, poderia muito bem passar como Joe Pesci. E o próprio Zé do Caixão, nos momentos mais histriônicos, não é outro senão Luís Inácio Lula da Silva, em postura e voz. Medo, muito medo.
Presságio (Alex Proyas, 2009)
Com: Nicolas Cage, Chandler Canterbury, Rose Byrne, Lara Robinson, Nadia Townsend
Ao colocar Nicolas Cage no papel de um pai cientista, amoroso e descrente, será que Alex Proyas consegue a credibilidade que seu longa precisa? Ou esta credibilidade independe daquele que já foi considerado um astro mas, até este filme, vinha engatilhando uma série de trabalhos francamente inexpressivos?
Cage não é detalhe em Presságio, mas não carrega o filme nas costas. O que faz este longa excepcional funcionar em vários níveis é a história, dramaticamente apocalíptica e sem qualquer preocupação em arrebatar pelo barulho, pelos efeitos, pela grandiosidade do conceito de fim ou de destruição.
O único momento em que Proyas pisa na bola é na cena-chave que envolve o garoto Chandler Canterbury. O moleque poderia ter entregue algo melhor. Mesmo assim, Presságio é um filmaço que merece fazer parte de qualquer coleção que se preze. Da sua e da minha.
Divagações postadas por Edward de 30-OUT a 3-NOV de 2009