Visto no cinema em 22-OUT-2009, Quinta-feira, sala 4 do Multiplex Pantanal
Há uma cena em especial em Bastardos Inglórios que me chamou a atenção mais que as outras. Trata-se do momento em que um personagem-chave falha miseravelmente em sua missão graças à magia do cinema. É um momento singular, porque nem se trata tanto da qualidade do que estava sendo exibido na tela grande, e sim do fato daquelas imagens estarem sendo simplesmente projetadas numa tela grande. Só isso. Temos então uma representação sutil, embora violenta e deslocada em tema e forma, da força que o cinema possui como meio de propaganda e motivação. Acima de tudo, uma declaração oblíqua de amor à sétima arte, suscitada em meio a um dos cenários mais improváveis para tal: um cinema que exibe um filme nazista durante a ocupação alemã na França de 1944.
Quentin Tarantino é um cara que prossegue refinando seu método de maneira espetacular. O cara sabe como ninguém reciclar influências de gêneros surrados pela crítica de modo a apetecer o público mais abrangente, imprimindo um senso de estilo de encher os olhos (e a mente). Seus trabalhos cada vez mais apresentam uma assinatura inconfundível, e Bastardos Inglórios prossegue a tendência ao praticamente fundir os conceitos clássicos do western com os filmes de guerra, da técnica à trilha sonora, da narrativa à encenação da violência. Há uma galeria de personagens memoráveis, dentre os quais se destacam o ardiloso coronel alemão caçador de judeus (Christoph Waltz) e a judia cuja família foi massacrada e mais tarde tem a chance de retribuir o sofrimento (Mélanie Laurent). Brad Pitt é o líder de um esquadrão secreto de judeus americanos cujo único objetivo é assassinar e escalpelar o maior número possível de nazistas na França ocupada. O grupo vê a oportunidade de acabar com a guerra quando Hitler e seus assessores mais importantes se reúnem para a estréia de um filme nazista em Paris, contando com o auxílio de uma atriz alemã (Diane Kruger) que é contra a ascensão do 3º Reich.
Sendo um longa de ficção que pega carona na história, falado em partes iguais de alemão, francês e inglês, Bastardos termina sendo um exercício fascinante ao estilo "o que aconteceria se", na maior parte um suspense que utiliza muito bem o senso geral de vingança suscitado pelo grupo de caçadores de nazistas. Tal qual o clássico Watchmen de Alan Moore, os únicos pontos de intersecção entre filme e realidade são os personagens e eventos históricos, o que resulta num retrato ácido, por vezes amargo e quase sempre incrivelmente engraçado de um período negro da história da humanidade. Imperdível.