Agente 86 (Peter Segal, 2008)
Com: Steve Carell, Anne Hathaway, Alan Arkin, Dwayne Johnson, Terence Stamp
Nesta releitura do famoso personagem da década de 60, as peripécias da espionagem recebem um upgrade considerável de cenas de ação, algumas impossíveis. 86 (Steve Carell) é um mero investigador que atua nos bastidores da agência de inteligência secreta americana conhecida como CONTROL, até o dia em que as identidades de todos os agentes de campo são comprometidas. Promovido, 86 forma uma parceria com a gatíssima 99 (Anne Hathaway) para impedir os planos da maléfica organização KAOS, controlada por um lunático terrorista (Terence Stamp). O diferencial que torna o filme diferente de pastiches similares e recentes como Johnny English é que o Agente 86 não é um completo idiota. As piadas dentro do roteiro amalucado surtem efeito, às vezes acompanhadas de tiradas impagáveis, como a das bombas "nuculares" do presidente americano. A presença do vetereno Alan Arkin ajuda a impôr uma dignidade muito bem-vinda à película, que definitivamente merece uma conferida.
Cartas de Iwo Jima (Clint Eastwood, 2006)
Com: Ken Watanabe, Kazunari Ninomiya, Tsuyoshi Ihara, Ryo Kase, Shido Nakamura
Filme-gêmeo de A Conquista da Honra, Cartas coloca o espectador lado a lado com os japoneses durante o episódio do embate entre americanos e japoneses na ilha de Iwo Jima, um dos momentos cruciais da Segunda Guerra Mundial. Ao contrário de sua contraparte falada em inglês, neste a história jamais deixa a zona de guerra (com exceção de alguns breves flashbacks), o que torna o drama dos soldados mais envolvente. Há três personagens principais nos quais o roteiro se concentra: o general responsável pela campanha japonesa (Ken Watanabe), um padeiro praticamente jogado dentro do conflito (Kazunari Ninomiya) e um ex-campeão olímpico de se tornou soldado de meia patente (Tsuyoshi Ihara). Sem se aprofundar nos meandros mais profundos da guerra, Eastwood compõe um panorama denso que expõe muitos dos motivos tanto para a resistência inesperada quanto para a derrota dos japoneses em Iwo Jima, como a falta de sintonia no alto escalão de comando, a insubordinação inconseqüente da linha de frente e a rigidez de um código cultural que foi em parte responsável pela ruína do Japão na guerra. Uma coisa é certa: dos dois filmes, este é com certeza o melhor.
Malabimba (Andrea Bianchi, 1979)
Com: Katell Laennec, Enzo Fisichella, Patrizia Webley, Mariangela Giordano, Pupita Lea
A.K.A. Malabimba - The Malicious Whore — Foi depois de ler alguma coisa sobre este filme na Internet que caiu minha ficha quanto às suas similaridades com o clássico O Exorcista. Acredito que a minha lerdeza se deve, basicamente, à ausência em Malabimba de gore ou sangue e à ênfase no aspecto erótico da adolescente que é dominada por um espírito maligno (Katell Laennec). Bimba, como é chamada, torna-se uma completa devassa depois que o sopro do além a domina em seu quarto, graças a uma sessão espírita que dá errado. Sua família é composta por um pai desajustado, uma avó austera, uma tia ninfomaníaca e um tio paralítico, sem contar alguns outros que transitam pelo castelo decrépito onde todos vivem, em especial a freira enfermeira (Mariangela Giordano) que cuida do tio inválido. Devo avisar que o filme contém um punhado de breves inserções pornográficas, que felizmente não comprometem seu ritmo. Elas nem mesmo denigrem a história, que por sua natureza assumida de guilty pleasure chega a se beneficiar com isto. Há outras qualidades que podem ser mencionadas, como o trabalho de câmera às vezes inspirado e a adequada trilha sonora, tudo isso para fazer um pastiche trash que não traz nenhuma amarra de censura e, em última instância, agrada. Se tivesse mais sangue, poderia facilmente ascender a uma categoria de respeito dentro do cinema obscuro de horror.
Esse Obscuro Objeto do Desejo (Luis Buñuel, 1977)
Com: Fernando Rey, Carole Bouquet, Ángela Molina, Julien Bertheau, Milena Vukotic
Obra-prima e último filme do inimitável Luis Buñuel, esta história sarcástica, dramática, engraçada e cruel é provavelmente a representação máxima da desgraça que uma mulher é capaz de trazer ao homem, uma vez que ela o tem sob seus encantos. A vítima é o aristocrata protagonizado por Fernando Rey, que arria as quatro rodas por Conchita, a recém-contratada camareira hispânica. Numa jogada típica de Buñuel, Conchita é interpretada por duas atrizes, Carole Bouquet e Ángela Molina, que se revezam e confundem o espectador quanto a alguma óbvia intenção do diretor por trás de tal estratagema. Ambas belíssimas, porém com fisionomias nada parecidas, elas estão perfeitas como a representação do tal "obscuro objeto do desejo", a força motora que leva o bode velho a um constante estado de angústia e desespero. O que torna o longa mais acessível a quem não curte muito as viagens surreais do diretor espanhol é o fato de que suas escapulidas no âmbito metafórico são bem reduzidas, jamais interferindo na narrativa de forma incisiva. Exemplos são as passagens em que o protagonista leva um saco nas costas, ou quando um bebê recém-nascido é substituído por um porco. Sob um certo ângulo, Esse Obscuro Objeto do Desejo soa como a evolução ideal do que Buñuel havia ensaiado 25 anos antes em O Alucinado. Fantástico!
Sintonia de Amor (Nora Ephron, 1993)
Com: Tom Hanks, Meg Ryan, Ross Malinger, Bill Pullman, Rosie O'Donnell
Não vou negar que a premissa desta comédia romântica é absurda. Da mesma forma, é preciso dar o devido crédito a Nora Ephron, que aqui compõe sua obra-prima, por ganhar nossa confiança e fazer-nos acreditar que o romance não está morto. Sim, meus caros, esse é o tipo de filme com potencial enorme para fazer tal milagre.
Tudo começa com pai (Tom Hanks) e filho (Ross Malinger) em profundo sofrimento pela trágica perda da mãe. Eles fogem de Chicago e se isolam em Seattle. Percebendo a solidão do pai, o moleque liga para um desses programas de rádio capitaneados por uma pseudo-psicóloga. Do outro lado do país, uma jornalista (Meg Ryan) ouve o depoimento do garoto... e o circo está armado. Movida inicialmente pela curiosidade, ela se aproxima do homem que parece significar algo mais que um sonho impossível. Meigo, extremamente engraçado e leve, Sintonia de Amor é uma comédia romântica daquelas que dá gosto assistir. Tem Ryan e Hanks no melhor de suas caracterizações "legais", tem fotografia de Sven Nykvist, tem uma trilha sonora impecável e conta com uma sensibilidade que Nora Ephron jamais conseguiu repetir em trabalhos posteriores.
Mensagem do Além (Lamberto Bava, 2006)
Com: Laura Harring, John Hannah, Pete Postlethwaite, Mosa Kaiser, Mary Twala
É triste ver o italiano Lamberto Bava flertando o fundo do poço com porcarias deste calibre. Realizador de pérolas como Demons (1985), aqui Bava se acomoda completamente, entregando uma palhaçada que desperdiça o elenco até decente e provoca risos involuntários. A história envolve uma americana vivendo na África (Laura Harring), que perde o marido (John Hannah) num acidente e tem que criar o filho ainda não nascido dos dois sozinha. Assim que nasce, o bebê começa a apresentar um comportamento pra lá de anormal, que parece possuir alguma relação com as aparições fantasmagóricas de seu próprio pai. Todo mundo paga mico nessa bobagem, que tem a pachorra de mostrar o tarado mais jovem de toda a história do cinema (!), enquanto o espectador tem a inteligência insultada durante uma hora e meia sem parar. Não tenham dúvidas, esta é uma bomba de marca maior.
Hancock (Peter Berg, 2008)
Com: Will Smith, Jason Bateman, Charlize Theron, Eddie Marsan, Jae Head, David Mattey
Com uma intenção louvável, que tenta imprimir um pouco da tridimensionalidade que os heróis de HQs acabaram incorporando nos anos recentes, Hancock apresenta uma releitura do mito do Super-Homem, desta vez à mercê de preocupações e vícios mundanos. No papel do personagem-título, Will Smith não faz muita coisa além de caras e bocas, falando pouco e provavelmente tendo se divertido um bocado ao filmar os efeitos especiais de vôos e lutas. Por qualquer lado que se olhe, no entanto, Hancock não consegue cumprir o que promete, seja como comédia ou como pastiche de super-herói. É bem capaz da platéia acabar simpatizando mais com o relações-públicas sonhador feito por Jason Bateman do que com o herói beberrão. A falta de um inimigo à altura do cara é provavelmente a maior falha do filme, que não pode contar simplesmente com a ajuda e a beleza de Charlize Theron, aliada a uma grande surpresa, como alavanca de conflito. Outra coisa que muita gente também pode estranhar é o modo como o diretor Peter Berg abusa dos closes, na tentativa de transmitir a angústia de seus personagens. Bem, talvez esse pessoal consiga melhorar o material na continuação, já que o potencial não é de todo desprezível.
Batman - O Cavaleiro das Trevas (Christopher Nolan, 2008)
Com: Christian Bale, Heath Ledger, Aaron Eckhart, Gary Oldman, Maggie Gyllenhaal
Dos vários acertos que fazem deste Batman - O Cavaleiro das Trevas um filme bem melhor que Batman Begins, o Coringa é de longe o melhor deles. Se havia uma coisa pela qual o primeiro filme pecava era pela seriedade doentia, aliada a cenas de ação forçadas e mal editadas. "Why so serious?", pergunta o Coringa a certa altura, como se estivesse agredindo não somente sua vítima, mas também a todos os envolvidos numa franquia que finalmente oferece alguma substância e se eleva acima do hype.
Carregada de um tom detetivesco e de uma tensão que aumenta gradativamente à medida em que o inicialmente inócuo Coringa (Heath Ledger) mostra a todos até que ponto pode chegar a sua loucura, a história começa com Batman (Christian Bale) tendo que lidar com vários imitadores seus no submundo de Gotham. Ele enxerga no novo promotor de justiça Harvey Dent (Aaron Eckhart) um aliado importante no combate ao crime, e forma junto com ele e com o tenente Gordon (Gary Oldman) uma improvável aliança para prender os chefões da máfia. Nesse ínterim, Rachel Dawes (Maggie Gyllenhaal) aparece espremida como o interesse amoroso tanto de Bruce Wayne quanto de Harvey Dent.
Não sou fã de Batman, mas admito que o filme é bem-feito, e é construído sobre um roteiro mais decente que a média. As cenas de ação são editadas corretamente e evitam a pirotecnia exacerbada, uma amostra de que Christopher Nolan e seu pretenso estilo pé-no-chão finalmente atingiram um ponto satisfatório entre a fantasia escapista e a violência urbana. Se há algo capaz mesmo de desanimar isso transparece na duração excessiva do filme e na substituição de Katie Holmes por Maggie Gyllenhaal. A primeira é uma gata mas carece de magnetismo dramático, enquanto a segunda é o exato oposto.
Bem, nem sempre é possível ter tudo o que se quer, não é mesmo?
Divagações postadas por Kollision entre 17 e 23 de Julho de 2008