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Filmes Vistos em Junho - Parte 2

Romeu + Julieta (Baz Luhrmann, 1996) 2/10

Com: Leonardo DiCaprio, Claire Danes, John Leguizamo, Harold Perrineau, Pete Postlethwaite

Em toda sua pompa e inacessibilidade lingüística contemporânea, a prosa de William Shakespeare provavelmente jamais será objeto de culto popular. Se depender deste esforço bizarro, então, a situação é pior ainda. Um mosaico histérico de emoções díspares, como uma metralhadora que atira para todos os lados e raramente consegue acertar alguma coisa. O primeiro instante em que eu pensei estar diante de um filme de verdade foi quando o elenco fechou a boca por mais de vinte segundos. Foi então que percebi que o filme melhorava consideravelmente sempre que o texto pesado do escritor inglês cedia espaço a um bem-vindo silêncio. Há um par de seqüências tensas e bem filmadas e uma trilha sonora bacana, mas nada disso é suficiente para salvar este delírio espaço-temporal de seus próprios excessos. Indicado sem contra-indicações mesmo só para os fãs hardcore de Shakespeare.

Totalmente Apaixonados (Bart Freundlich, 2007) 6/10

Com: David Duchovny, Julianne Moore, Billy Crudup, Maggie Gyllenhaal, Eva Mendes

A comédia romântica adulta – concebida para a platéia que já não é mais adolescente mas às vezes não sabe como deixar de sê-lo – ganha mais um representante típico em Totalmente Apaixonados. Há personagens para todos os gostos para que a platéia possa se identificar, representados pelo par casado e estabilizado (Julianne Moore e David Duchovny) e pela dupla de namorados de longa data que não consegue dar o próximo passo no relacionamento (Maggie Gylenhaal e Billy Crudup). O elenco principal foi bem escolhido no sentido de que nenhum deles possui um sex appeal fora do comum, o que coloca o filme numa zona confortável de realismo e identificação pela platéia. Durante o decorrer da história, estereótipos e expectativas são frustrados e personagens em conflito devidamente redimidos. O produto final é bonitinho, mas não necessariamente ordinário.

A Vila (M. Night Shyamalan, 2004) 10/10

Com: Joaquin Phoenix, Bryce Dallas Howard, Adrien Brody, William Hurt, Sigourney Weaver

Uau! O que uma revisão não é capaz de fazer num filme que já era ótimo!

A Vila é um espetáculo não só belíssimo e intrincadamente provocante, como também uma confluência raramente vista de metáforas sobre inúmeros aspectos do que a civilização atual tem de pior e de melhor. Para Shyamalan, a preservação da inocência é deturpada até seu limite dentro do conto obscuro sobre as criaturas escarlates que oprimem os habitantes de um vilarejo encravado na floresta. A sutileza avassaladora da técnica espetacular, da fotografia e do desempenho do elenco faz o filme transcender o gênero no qual se insere, e marca um dos trabalhos mais fascinantes que o cinema foi capaz de entregar nos últimos anos.

La Nuit des Traquées (Jean Rollin, 1980) 6/10

Com: Brigitte Lahaie, Vincent Gardère, Dominique Journet, Bernard Papineau, Catherine Greiner

A.K.A. The Night of the Hunted – O francês Jean Rollin concretiza neste filme uma tentativa válida de mesclar os estilos aos quais havia se dedicado até então, numa história singular que, mais uma vez, evoca o bizarro através de uma atmosfera onírica e ousa inserir dentro dela um aspecto erótico bastante proeminente. A ex-estrela pornô Brigitte Lahaie é o centro da trama, no papel de uma mulher com disfunções de memória resgatada no meio da noite por um motorista. O espectador vai descobrindo aos poucos de onde ela vem e como a moça chegou àquele estado deplorável, em meio a passagens de puro delírio, violência, gore e alguma nudez, sem jamais abandonar a cenografia etérea tão característica do diretor. O filme não chega a se destacar como um de seus melhores trabalhos, mas tem um certo charme que se sustenta com a presença de Brigitte Lahaie e com o tratamento fora da curva dado à história.

Alta Tensão (Alexandre Aja, 2003) 6/10

Com: Cécile De France, Maïwenn Le Besco, Philippe Nahon, Franck Khalfoun, Andrei Finti

Como muitos outros exemplares já produzidos dentro do grupo de filmes sobre psicopatas, este longa francês é pródigo em se mostrar inerte, com um roteiro aparentemente construído a partir de decisões estúpidas. Só aparentemente, já que é preciso ir além da superfície para perceber nele algum valor narrativo. O diretor Alexandre Aja, que com sua performance seria depois promovido ao comandante da fortíssima refilmagem Viagem Maldita (2006), ousa dar um passo além, que, bem, não é nenhum estouro mas também não deixa o espectador desapontado. Mesmo com uma queda de ritmo acentuada no trecho intermediário e com os buracos no roteiro (que se tornam ainda maiores com a surpresa dos 20 minutos finais), o saldo final é positivo. Na história, garota vai passar o fim de semana com a família de uma amiga no campo, quando um assassino aparece sem mais nem menos e começa a matar todos na casa com requintes da mais absoluta crueldade.

Favor não confundirem este Alta Tensão com o filme de título brasileiro homônimo dirigido por John Badham em 1990.

La Vera Storia della Monaca di Monza (Bruno Mattei, 1980) 4/10

Com: Zora Kerova, Mario Cutini, Franco Garofalo, Paola Corazzi, Tom Felleghy

A.K.A. The True Story of the Nun of MonzaNunsploitation desleixado, que fica na linha intermediária entre um drama religioso e um pastiche de erotismo soft. O diretor Bruno Mattei (aqui sob o pseudônimo de Stefan Oblowsky) começa bem ao impôr intransigências antes mesmo dos créditos de abertura acabarem – ele interpõe cenas de um coito eqüino com a ordenação da freira do título (Zora Kerova) no convento que inevitavelmente servirá como covil da sordidez. Graças ao seu título de nobreza e à queda da madre superiora, ela logo ascende à categoria-mor da ordem. A proximidade de um padre porcaria (Franco Garofalo) e seu amigo estourado e tarado (Mario Cutini) acaba por liberar seus desejos reprimidos e blá-blá-blá... A direção de Mattei tem certas qualidades, mas a narrativa deixa a desejar, a história e os personagens são desinteressantes e no geral a obra decepciona tanto no drama quanto no teor caliente.

Zodíaco (David Fincher, 2007) 8/10

Com: Jake Gyllenhaal, Mark Ruffalo, Robert Downey Jr., Anthony Edwards, John Carroll Lynch

A história do Zodíaco, o assassino que aterrorizou San Francisco incólume no final da década de 60 e deu um baile na polícia, já serviu de inspiração para inúmeros filmes. O Zodíaco de David Fincher, no entanto, é com certeza a adaptação mais fiel e ambiciosa do caso, e mesmo em suas liberdades narrativas procura se manter inserido na investigação que os registros policiais documentam desde que o bandido enviou sua primeira carta cifrada aos jornais, em 1968. O filme se concentra sobre um grupo de pessoas que se dedicou a desvendar o mistério, que inclui os policiais responsáveis pelo caso (Mark Ruffalo e Anthony Edwards), um repórter investigativo (Robert Downey Jr.) e o cartunista que mais tarde escreveria o livro no qual o longa se baseia (Jake Gyllenhaal). A maestria da direção de Fincher e o roteiro consistente são o que garantem o envolvimento da platéia com o filme, cuja longa duração me passou despercebida. A investigação da identidade do assassino conforme mostrada na história, no entanto, é uma prova cabal da falta de atenção da polícia da época (as primeiras pistas encontradas pelo personagem de Gyllenhaal na segunda metade do filme assombram por sua simplicidade).

Não sei se alguém notou na cena do interrogatório, mas parece haver ali uma gracinha que David Fincher colocou deliberadamente, e que só quem assistiu a Clube da Luta (1999) poderá entender do que se trata. Bem, quando o DVD sair será possível confirmar se eu estava enxergando direito ou se o "glitch" não passou de sujeira no equipamento de projeção do cinema.

Subida ao Céu (Luis Buñuel, 1952) 6/10

Com: Esteban Márquez, Lilia Prado, Luis Aceves Castañeda, Carmelita González, Manuel Dondé

Os filmes mexicanos de Luis Buñuel no início da década de 50 compartilham uma identidade pitoresca, demarcada pelo cotidiano suburbano e pela introdução com a narração em off apresentando a situação sobre a qual a história se desenrolará. Os Esquecidos e A Ilusão Viaja de Trem fazem parte desta fase, mas é com este último filme que Subida ao Céu se assemelha mais, tanto no tema quanto na presença da fenomenal Lilia Prado, atriz que exalava sensualidade com sua postura marota e atrevida. Ela é a tentação no caminho do jovem Oliverio (Esteban Márquez), que precisa viajar de ônibus até uma cidade grande para evitar que seus irmãos gananciosos se apossem dos bens da mãe, às portas da morte e sob os cuidados de sua jovem esposa. A religiosidade metafórica latente na história é disfarçada por retratos de uma rotina marcada por vitórias e perdas, com várias passagens diametralmente opostas em significado (uma mãe que comemora a vida enquanto outra definha, uma criança que vem à luz dentro do ônibus enquanto outra é nele transportada para ser enterrada, um político autoritário que encontra num adversário um grande exemplo de igualdade e respeito).

A produção do filme pode não estar entre as melhores da carreira de Buñuel mas, como curiosidade, notem como ele lança mão de efeitos especiais e miniaturas para dar vida à jornada do ônibus em sua subida pela montanha.

Contos Proibidos do Marquês de Sade (Philip Kaufman, 2000) 9/10

Com: Geoffrey Rush, Kate Winslet, Joaquin Phoenix, Michael Caine, Amelia Warner

Figura importantíssima dentro do desenvolvimento da prosa profana/pornográfica e da luta pela quebra de tabus, o marquês de Sade viveu entre duas Franças – a monarquia pré-Revolução e a nova nação que nascia sob o comando de Napoleão Bonaparte. O filme de Philip Kaufman se debruça sobre a segunda e derradeira fase da vida do escritor (Geoffrey Rush), então internado num sanatório administrado por um abade fervoroso e compreensivo (Joaquin Phoenix). As transgressões do texto de Sade passam a incomodar a tal ponto que Napoleão envia para supervisionar seu tratamento o "especialista" interpretado por Michael Caine. A camareira que ajuda o marquês (Kate Winslet) é um dos coringas que refletem as conseqüências da prosa incendiária do escritor, numa história filmada com muita classe e que extrai o máximo dos personagens e do ótimo elenco.

Planeta dos Macacos (Tim Burton, 2001) 8/10

Com: Mark Wahlberg, Tim Roth, Helena Bonham Carter, Estella Warren, Paul Giamatti

Em primeiro lugar, esta é uma boa refilmagem. Boa não, excelente.

De todas as refilmagens de filmes clássicos feitas no século 21, Planeta dos Macacos foi a que com mais propriedade aliou a atualização do tema original à nova tecnologia disponível para retratar a história. Esta, embora sem se distanciar muito do conceito mostrado no clássico dirigido por Franklin J. Schaffner em 1968, aproveita para incorporar algumas idéias diluídas ao longo dos cinco filmes da série original, e traz de brinde um final ambíguo que não deixa margem para certezas absolutas. A representação da sociedade dos macacos é espetacular, assim como a caracterização da maioria dos personagens símios, que chegam até mesmo a reter as feições dos atores que os interpretram (Tim Roth faz um dos maiores vilões da ficção científica em tempos). Tim Burton foi a escolha ideal para dirigir o filme, que se beneficia sobremaneira da veia inquieta do cineasta quando o assunto em questão envolve fantasias escapistas.

Divagações postadas por Kollision entre 22-JUN e 1-JUL de 2007