Quentin Tarantino deu o seu jeito de causar furor e antecipação com o segundo capítulo de Kill Bill, obra originalmente dimensionada para ser um único filme. Como antes havia sido feito com De Volta para o Futuro 2 e 3 e Matrix Reloaded/Revolutions, um hiato de cerca de 6 meses foi inserido entre um episódio e outro, deixando a platéia em suspenso e sedenta pela continuação de um dos mais bizarros e originais filmes feitos nos últimos anos.
A saga da Noiva (Uma Thurman) iniciada no Volume 1 é retomada do ponto onde parou, porém com uma mudança no tom que choca pela ausência do sangue em profusão e da ação praticamente ininterrupta (que fizeram do primeiro filme uma debochada viagem fantástica). Dotada de mais flashbacks e extremamente mais contemplativa, esta segunda parte se inicia com uma recordação mais detalhada do fatídico dia do casamento, marcado pela chegada de Bill ao ensaio da cerimônia e seguido do massacre perpetrado pelos assassinos de sua gangue. No caminho da Noiva entram primeiramente os dois mercenários remanescentes, Budd (Michael Madsen) e Elle Driver (Daryl Hannah). Ao final, Bill reaparece para o inevitável confronto. Ao longo do filme, a relação entre os dois (Bill e a Noiva) é esclarecida e esmiuçada. Muitas questões são levantadas, e a dúvida sobre quem vencerá o duelo final toma contornos um pouco mais complexos do que uma simples vingança.
Com 30 minutos de filme fica claro para qualquer um o quanto a segunda parte da história é diferente da primeira. Enquanto o início da vingança da Noiva tinha um aspecto cartunesco e propositalmente exagerado na inexorável rota de colisão da moça contra seus desafetos, o volume 2 é pausado, econômico em ação (mas ainda cômico), repleto de longos e espirituosos diálogos, alguns à la Pulp Fiction, e dotado de cinematografia e ângulos que parecem transformá-lo às vezes num western moderno. As quebras de narrativa traduzem-se pelos flashbacks recorrentes, sendo o mais marcante deles o treinamento da noiva com o mestre Pai Mei (Chia Hui Liu, ou Gordon Liu). Personagem egresso de vários filmes antigos de artes marciais, o velhinho responde pelos momentos mais engraçados da película, com os trejeitos e maneirismos que só um grande mestre de sua estatura poderia possuir.
O epílogo da epopéia iniciada no primeiro filme (que pode se tornar uma trilogia daqui a duas décadas, de acordo com o próprio Tarantino) é coerente, e o diretor se esforça para tornar o fiapo de história interessante, com todo o passado conjunto entre a Noiva e Bill, seu amado antes de descobrir que estava grávida. No entanto, o esforço para fazer o "enchimento dramático" da história vem a soar um pouco desnecessário, por exemplo, nos diálogos pausados e lentos demais, ou na seqüência que mostra o cotidiano do assassino Budd, que quebra demasiadamente o ritmo. A ferocidade demonstrada na primeira parte só encontra paralelo aqui na luta desesperada entre a Noiva e a assassina Elle Driver.
As referências neste filme também vêm em menor quantidade, e de forma bem menos evidente. Interessante notar, por exemplo, que todos os codinomes dos assassinos têm algo a ver com serpentes. No fim das contas, o produto resultante dos dois filmes é uma obra originalíssima em sua essência, cujas partes complementares devem ser vistas preferencialmente uma após a outra, sem intervalo.
A edição simples do DVD que faz parte do pacote que vem também com o primeiro filme traz um making-of de quase meia hora, uma galeria de fotos, trailer e também os trailers de Jackie Brown e Kill Bill - Vol. 1.
Texto postado por Kollision em 16/Outubro/2004
Filme revisto em DVD em 3-MAR-2007, Sábado - Texto revisado em 8-MAR-2007