30 Dias de Noite (David Slade, 2007)
Com: Josh Hartnett, Melissa George, Danny Huston, Ben Foster, Mark Boone Junior
30 Dias de Noite é a maior prova de que nem sempre um bom material de HQs rende um bom filme, principalmente considerando que o criador da HQ é também o roteirista do longa. A idéia é bacana mas mal aproveitada: quando a cidadezinha remota de Barrow, no Alaska, entra num período invernal de 30 dias em que o sol não brilha, uma horda de vampiros aparece e deflagra uma matança sem precedentes. O xerife local (Josh Hartnett) é um dos poucos que consegue fazer frente à ameaça e proteger um grupo de sobreviventes, entre eles sua ex-esposa (Melissa George). Tirando o gore, é triste constatar que nada mais funciona na história. O suspense é nulo (não confundam isso com violência), a tensão entre o casal central é construída e tratada pobremente, a caracterização dos demais personagens é inexistente e os vampiros são tão unidimensionais que dói. Do jeito que está, o roteiro se tornou um queijo suíço de situações impossíveis, e o final é constrangedor num nível absurdo. Fica a esperança de que as aventuras do detetive Cal McDonald – de Crimes Macabros, a outra cria maior de Steve Niles – sejam retratadas de forma mais decente quando ganharem uma versão de cinema.
Rede de Mentiras (Ridley Scott, 2008)
Com: Leonardo DiCaprio, Russell Crowe, Mark Strong, Golshifteh Farahani, Oscar Isaac
Retornando ao ambiente árido que havia visitado no agressivo Falcão Negro em Perigo, Ridley Scott tece uma aventura de espionagem e terrorismo que se passa no Oriente Médio, mais uma vez com a ajuda de seu fiel colaborador Russell Crowe. Crowe é um chefão da CIA que controla várias operações anti-terrorismo sem sair do conforto de seu lar nos EUA, e entre seu grupo de agentes de campo está Leonardo DiCaprio. Ambos estão na cola de um terrorista islâmico inatingível, e suas ações acabam os levando a se aliar ao chefe da inteligência da Jordânia (Mark Strong, de fato roubando a cena). Rede de Mentiras é dividido em dois grandes atos, que de certa forma fazem com que a primeira metade do filme soe longa demais quando a história se fecha. Scott coloca ênfase na ação e na caracterização de personagens, evitando complicações ideológicas e estabelecendo uma dicotomia operativa e moral entre os agentes feitos por Crowe e DiCaprio. Bem, qualquer visão sobre o tema que não lembre a bagunça intragável de Syriana (Stephen Gaghan, 2005) já está de bom tamanho.
Max Payne (John Moore, 2008)
Com: Mark Wahlberg, Beau Bridges, Mila Kunis, Chris 'Ludacris' Bridges, Chris O'Donnell
Sim, mais uma adaptação de um vídeo-game. E não, não é nada parecido com Constantine, como dá a indicar o trailer. Para todos os efeitos, Max Payne é um filme policial que tem mais coisas em comum com a saga do Justiceiro, personagem polêmico da Marvel Comics. Payne (Mark Wahlberg) é um tira marcado pelo assassinato trágico da esposa e do filho bebê, um crime não resolvido que volta a assombrá-lo quando uma série de pessoas começa a aparecer desmembradas em circunstâncias pra lá de estranhas. Com um desenvolvimento irregular e clima noir um pouco forçado, o filme pelo menos tem boas cenas de ação, e aparentemente demonstra toda a influência cinemática do game quando o personagem principal inicia a fase final de sua caçada pelos culpados da morte de sua família. Wahlberg parece deslocado em cena, mas a presença de gente como Beau Bridges e Chris O'Donnell ajuda a manter um padrão de interpretação decente. Caramba, até Mila Kunis ficou bem no filme! De resto, a história é bem previsível. O importante é que, como um filme policial adaptado de um game, até que este aqui não faz feio.
La Noche de las Gaviotas (Amando de Ossorio, 1975)
Com: Víctor Petit, María Kosty, Sandra Mozarowsky, José Antonio Calvo, Julia Saly
A.K.A. Night of the Seagulls — Este é o último capítulo da saga dos blind dead, de autoria do cineasta espanhol Amando Ossorio, e a coisa mais útil que posso dizer sobre o filme é que ele nem precisava existir. Ainda bem que o negócio parou por aqui, porque o nível já estava bem inferior ao aceitável, mesmo para uma produção de baixíssimo orçamento. Somando-se à já surrada e inalterada balela dos cavaleiros templários bebedores de sangue, temos desta vez uma trama lerda em que uma vila de gente insuportável sacrifica suas belas adolescentes virgens para satisfazer os mortos-vivos em seu ciclo de 7 anos e 7 dias de excursão fora das tumbas, que inclui um passeio noturno pela praia para a tomada das tenras "oferendas". Somente o recém-chegado médico novato (Víctor Petit) e sua esposa (María Kosty) tentam fazer algo a respeito, e é aí que o caldo entorna (em todos os sentidos possíveis). A repetição de idéias, a direção sem qualquer inspiração e o subaproveitamento das virgens sacrificadas fazem com que este seja o pior filme da série. O maior exemplo de estupidez, contudo, é a tal associação com as gaivotas do título, uma coisa simplesmente absurda.
Beleza Americana (Sam Mendes, 1999)
Com: Kevin Spacey, Annette Bening, Thora Birch, Wes Bentley, Chris Cooper
Eu sabia que esse negócio de ir pra casa de mamãe e comer arroz com pequi todo dia só podia dar nisso... Eis que, ao chegar em casa e dar uma olhada de perfil no espelho, noto que a barriguinha parece ainda mais proeminente do que de costume, implacavelmente evidenciando que o excesso de delícias pequizeiras teve uma conseqüência que precisava ser tratada de forma urgente.
Duas constatações vieram-me à mente então. A primeira delas é que mais uma vez eu teria que tomar uma dose cavalar daquele remédio que todo mundo sabe que precisa tomar mas quase nunca consegue. Sim, meus caros, refiro-me ao temido Vergonhol. E uma volta urgente à prática de exercícios físicos, acompanhada de uma nova tentativa de estabelecer uma rotina de alimentação mais saudável.
A segunda constatação tem a ver com o porquê de eu estar escrevendo isso num texto que deveria discorrer sobre um filme. Ora bolas, se você já assistiu a Beleza Americana, sabe exatamente do que estou falando. E sabe também que minha motivação não tem nada a ver com a do personagem de Kevin Spacey, muito embora certos aspectos relacionados não deixem de ser comuns. O ponto crucial é que, graças ao reflexo da minha barriguinha no espelho, tive uma vontade danada de rever o filme.
Beleza Americana, ganhador de 5 Oscars, incluindo melhor filme, roteiro e ator, tem sido vítima de uma campanha de difamação que tenta taxá-lo como um dos filmes mais superestimados da história do cinema, o que é absolutamente injusto. Trata-se de um trabalho fantástico, fenomenal em suas sutilezas e extremamente agradável de se ver. A história é narrada por um homem de meia idade (Kevin Spacey) que redescobre a vontade de viver mas, em última instância, paga um preço caro por isso. Logo no começo do filme ficamos sabendo que ele vai morrer, coisa que vira e mexe o protagonista faz questão de nos lembrar. Ao mesmo tempo engraçado e trágico, o filme desnuda as aparências da família de classe média americana enquanto trabalha valores morais/sociais por meio de seus fragmentados personagens, cada um deles imerso num conflito particular nem sempre explícito aos olhos da platéia. A direção é primorosa e amparada por um elenco fantástico. A maior realização do filme, no entanto, é fazer com que o desfecho trágico e anunciado não se eleve acima das mensagens positivas de sua história. Acreditem, trata-se de uma obra que te faz se sentir genuinamente bem assim que os créditos começam a subir – algo raro de se ver em ganhadores de Oscar, pelo menos os da última década.
O Rosto (Ingmar Bergman, 1958)
Com: Max von Sydow, Ingrid Thulin, Gunnar Björnstrand, Bengt Ekerot, Åke Fridell
Há algo anormal na trupe de artistas itinerantes liderada por Max Von Sydow, que chega em sua carruagem a um vilarejo e precisa passar pelo crivo das autoridades locais antes que possa fazer sua habitual apresentação à plebe, um show que envolve misticismo barato e hipnotismo. Essa anormalidade, que transparece do início ao fim do filme, desde a estranha mudez do líder até a eloqüência quase irritante de um membro da equipe, é algo que Ingmar Bergman não faz questão alguma de atenuar. Nisso reside parte da força de seu cinema, uma característica que muitos outros filmes falham miseravelmente em estabelecer. O elenco bergmaniano é estelar e aparece em grande forma, compondo o embate metafórico entre ciência e religião com maestria. Cedo ou tarde, os personagens caem um por um de seus tronos pessoais, mas é a frieza gélida de Ingrid Thulin, num papel andrógino e irresistivelmente sexy, que mantém a unidade da trupe de supostos charlatões e mais fortemente se recusa a abandonar a redoma de estranheza que domina a história. Enfim, eis um filme que se convida a uma nova sessão com louvor, o que é praticamente rotina em se tratando de Ingmar Bergman.
Ligeiramente Grávidos (Judd Apatow, 2007)
Com: Seth Rogen, Katherine Heigl, Paul Rudd, Leslie Mann, Jason Segel
Nesta revisão, pude notar com mais atenção o verdadeiro grau de concessões que é feito na história do casal atípico que descobre que vai ter um filho, depois de uma noitada regada a muita cachaça. Todas elas são praticamente orientadas a tornar o personagem de Seth Rogen mais simpático (o que não é ruim e dá esperança para as categorias dos nerds e rejeitados), com um eventual e inevitável amadurecimento tanto dele quanto daqueles que o cercam. Katherine Heigl é muito boazinha – em todos os sentidos – uma coisa extremamente difícil de se ver na vida real. Talvez mais interessante em determinados momentos, porém, é o casal coadjuvante feito por Leslie Mann e Paul Rudd, que personifica com leveza muitas das situações vividas por casais de verdade. Ou será que eu me identifiquei mais com eles do que com os protagonistas? O fato é que Ligeiramente Grávidos continua sendo uma ótima comédia, bastante diferente do que se vê por aí e ainda assim familiarmente engraçada.
Les Trottoirs de Bangkok (Jean Rollin, 1984)
Com: Yoko, Françoise Blanchard, Jean-Claude Benhamou, Jean-Pierre Bouyxou, Brigitte De Borghese
A.K.A. The Sidewalks of Bangkok — Quanto mais Jean Rollin se afasta dos temas que lhe são caros (o vampirismo e o sobrenatural), mais a qualidade de seus filmes sofre. Talvez nem seja qualidade, e sim inadequação, uma vez que ele tenta tratar uma historieta de espionagem porca como esta como se fosse um de seus pastiches oníricos. Praticamente nada funciona, e mesmo o erotismo voyeurista tomba diante de uma série interminável de cenas mal filmadas, algumas sem qualquer sentido dentro do contexto da história, uma palhaçada vergonhosamente amadora e ambiciosa que faz membros do serviço secreto francês irem a Bangkok atrás da namorada (Yoko) de um agente morto, na esperança de recuperar uma arma química extraviada. Paralelo a isso, uma organização feminina terrorista, liderada pela veterana Brigitte De Borghese, também tem interesse no produto. Nenhuma filmagem foi feita de verdade em Bangkok, o que se vê de lá são somente cenas granuladas em 8mm que nada têm a ver com o filme. Sim, o orçamento é baixíssimo, para não dizer inexistente, mas nesse caso também seria necessário algum senso de ridículo. O mais inacreditável é que essa porcaria foi um dos maiores sucessos financeiros de Jean Rollin que, anos mais tarde, cometeria mais baboseiras nessa mesma vertente, vide o igualmente tosco Killing Car.
Divagações postadas por Kollision de 7 a 13 de Dezembro de 2008