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Filmes Vistos em Agosto - Parte 2

A Identidade Bourne (Roger Young, 1988) 6/10

Com: Richard Chamberlain, Jaclyn Smith, Anthony Quayle, Donald Moffat, Denholm Elliott

Praticamente na linha divisória entre a espionagem analógica e o avanço digital que hoje é coisa usual, esta primeira versão do livro de Robert Ludlum contém o drama completo do desmemoriado Jason Bourne (Richard Chamberlain), um agente perigosíssimo à procura de seu passado. Feito para a TV em duas partes de uma hora e meia, o filme consegue entreter e representa uma amostra interessante de uma época em que um mero celular podia fazer MUITA diferença na vida e na morte de um espião. A ainda chamosíssima ex-pantera Jaclyn Smith é seu contraponto romântico em meio ao caos que abrange Zurique, Paris e Nova York, e uma das coisas mais interessantes da obra é o desenvolvimento de seu relacionamento com Bourne. O filme utiliza ao máximo os cartões-postais de suas locações, e garante uma razoável (e longa) sessão descompromissada se o espectador estiver com coragem de encarar as suas 3 horas de duração.

Ôdishon (Takashi Miike, 1999) 9/10

Com: Ryo Ishibashi, Eihi Shiina, Tetsu Sawaki, Jun Kunimura, Renji Ishibashi

A.K.A. Audition – O filme que revelou o nome do japonês Takashi Miike ao mundo é um ataque aos sentidos meticulosamente planejado e executado, quase como uma ópera de horror onde o crescendo atinge píncaros de agonia numa dolorosa catarse visual, física e sensorial. A lenta descida do protagonista a um universo antes aparentemente seguro é capturada com inclemência pela câmera de Miike, que denuncia a anormalidade quando sai do tripé e se entrega a tomadas POV (Point of View) de natureza desconcertante.

Saindo da zona de conforto após um conselho do filho, um produtor de TV viúvo (Ryo Ishibashi) arranja uma audição falsa de um filme fictício com o objetivo de encontrar sua nova esposa. Sua escolhida (Eihi Shiina) é bonita, recatada e sensível, mas de cara levanta a suspeita de seu melhor amigo. O bode velho, no entanto, insiste em perseguir a chama do amor, e eventualmente acaba descobrindo a verdade sobre a garota. A solidão dos personagens é usada como contraponto para a explosão de sangue que domina o trecho final da história, que rompe as amarras narrativas anteriormente estabelecidas sem dó nem piedade e possui um impacto macabro realmente capaz de chocar olhos sensíveis. A ambigüidade resultante é sublime e levanta mais perguntas que respostas, num trabalho belo que alia delírio e realidade como poucos em seu gênero.

Abismo do Medo (Neil Marshall, 2005) 8/10

Com: Shauna Macdonald, Natalie Mendoza, Alex Reid, Saskia Mulder, MyAnna Buring

Abismo do Medo é tudo o que uma recente porcaria chamada A Caverna tentou ser e não conseguiu. Um suspense rotineiro que, lá pelas tantas, deve evoluir para uma jornada de horror mórbida e claustrofóbica. Com um elenco liderado somente por mulheres – o grupo de seis amigas esportistas que decidem explorar uma caverna não mapeada (mas só uma delas sabe disso) – o filme de Neil Marshall transpira tensão e é extremamente feliz na caracterização das criaturas que habitam a escuridão. A ótima hipérbole narrativa é bem delineada pela cena inicial e pelo embate final, plantando a sementinha de uma discórdia que explode a centenas de metros sob a superfície, em meio a muito sangue, escuridão e corpos em decomposição. Perdoando-se algumas arapucas técnicas, o que se vê é um longa extremamente sólido, que aproveita suas várias influências para criar algo genuinamente assustador.

Ensaio de um Crime (Luis Buñuel, 1955) 7/10

Com: Ernesto Alonso, Miroslava Stern, Ariadna Welter, Rita Macedo, Carlos Riquelme

Na composição deste filme, Buñuel explora uma faceta obscura da psiquê humana com um toque mordaz visível no modo como o protagonista (Ernesto Alonso) é retratado. Boa pinta, alegre e comunicativo, ele é ao mesmo tempo atormentado por uma experiência traumática de infância, daquelas coisas que só quando somos crianças é capaz de nos impresisonar de uma forma indelével, marcando-nos pelo resto da vida. Já adulto, é ele quem recapitula as suas atitudes de natureza homicida, colocando em xeque a linha divisória entre ato e intenção, que poucas vezes foi tão nebulosa e bem fundamentada. Visto também como uma comédia de erros, pode-se notar como Ensaio de um Crime constituiu uma nítida fonte de inspiração para cineastas fatalistas como Woody Allen e Pedro Almodóvar, acostumados a entregar filmes de natureza similar.

A Identidade Bourne (Doug Liman, 2002) 7/10

Com: Matt Damon, Franka Potente, Chris Cooper, Brian Cox, Clive Owen

Ao revisitar o texto do escritor e ex-ator Robert Ludlum, o diretor Doug Liman atualiza a trama com um protagonista mais jovem e reviravoltas suficientes para preencher um filme de duas horas apenas. Assim, seu A Identidade Bourne tornou-se um filme dinâmico e tenso, sem no entanto conter tantas cenas de ação quanto o cinema de entretenimento à epoca de seu lançamento esperava. Por falar nisso, o que ninguém esperava era que o longa fizesse tanto sucesso – de público e de crítica – e que Matt Damon pudesse ser o amnésico Jason Bourne com tamanha naturalidade. Resgatado inconsciente e sem memória no mar, Bourne descobre aos trancos e barrancos que era um agente perigosíssimo com um destino nebuloso, e com um punhado de assassinos na sua cola para apagá-lo. A história é um prato cheio para quem gosta de tramas de espionagem bem filmadas, nesta adaptação que praticamente redefiniu o gênero para o século XXI.

Escravas do Desejo (Harry Kümel, 1971) 7/10

Com: Delphine Seyrig, John Karlen, Danielle Ouimet, Andrea Rau, Paul Esser

Atmosférico e envolvente, o único porém deste filme é um personagem intrometido inexplicavelmente jogado dentro da história (o policial aposentado com olheiras). De resto, a ambientação obtida é um espetáculo de exposição macabra, que ganha contornos riquíssimos graças a flertes com o bizarro que nem por isso jogam o filme dentro da redoma do surreal. Um casal recém-casado a caminho de Londres faz uma parada num hotel de luxo da Holanda, caindo vítima da cobiça de uma condessa vampira (Delphine Seyrig) e sua jovem assistente (Andrea Rau). A desolação do lugar e a ótima interpretação de Seyrig estabelecem o tom fatal de decadência da qual a história é impregnada. Tudo é valorizado pelo ótimo senso estético do diretor, mesmo com o ritmo às vezes lento e com o destino da condessa na resolução final, de fato um pouco decepcionante.

A Morte Pede Carona (Dave Meyers, 2007) 5/10

Com: Sean Bean, Sophia Bush, Zachary Knighton, Neal McDonough, Kyle Davis

Não me entra na cabeça qual seria o motivo de se fazer uma refilmagem que não passa de cópia-carbono, pura e simplesmente... Seria a boa e velha (leia-se ruim e imbecil) justificativa de se "atualizar" o semi-clássico da década de 80? A idéia era mostrar mais gore?

Se você já teve a honra de assistir ao original, não perca seu tempo com este aqui. Com exceção de algumas inversões de situações e do início disfarçado, a cartilha é a mesma pavimentada pelo diretor Robert Harmon em 1986. O destino dos personagens não muda nadica de nada (isso pode se qualificar como SPOILER?), a sensação de desolação é diminuída e a trilha sonora é anabolizada por bandas emo. Sean Bean não é mau ator, mas simplesmente não pode com a representação psicopata do velho Rutger Hauer. E o diretor, um especialista em videoclipes, provavelmente nem se deu ao trabalho de tentar fazer alguma coisa diferente, o que torna essa refilmagem indicada mesmo somente para os avoados que consideram filmes dos anos 80 velhos demais para serem bons.

A Supremacia Bourne (Paul Greengrass, 2004) 8/10

Com: Matt Damon, Brian Cox, Joan Allen, Franka Potente, Julia Stiles

Assistir aos filmes de Jason Bourne em seqüência é uma atitude que traz várias vantagens. Uma delas, obviamente, é acompanhar com um maior grau de discernimento a intrincada narrativa e as motivações dos personagens que habitam seu universo. A outra é constatar que Paul Greengrass conseguiu superar o resultado do filme original de Doug Liman, preservando sua identidade e desenvolvendo a trama com elegância. Eu tinha até me esquecido da espetacular cena de perseguição do clímax, que transforma as ruas de Moscou num palco de destruição sem precedentes.

Pergunto-me, no entanto, qual seria o porquê do título "Supremacia", adotado tanto no romance original de Robert Ludlum quando no longa-metragem. Será que é porque Bourne está sempre um passo à frente daqueles que querem vê-lo morto? Depois deste filme, a expectativa só pode ser a melhor para O Ultimato Bourne.

A Volta do Todo Poderoso (Tom Shadyac, 2007) 5/10

Com: Steve Carell, Lauren Graham, Morgan Freeman, John Goodman, Wanda Sykes

Deus (Morgan Freeman) desce à Terra novamente para atender às preces de mais um mortal, o ex-jornalista e agora político Evan (Steve Carell). Só que, desta vez, não são poderes ilimitados que ele confere ao cara, mas sim uma missão, a qual ele terá que cumprir sem super poderes e com a ajuda da própria família. Só daí já dá para ter uma idéia de que a âncora para o conflito é pelo menos mais consistente que a de Todo Poderoso. Steve Carell carrega o filme nas costas. A história caminha para um beco sem saída e força a barra no final, mas tudo faz parte da obrigatória mensagem que acompanha a maioria dos obras de Tom Shadyac. As coisas neste caso fazem menos sentido ainda, como provavelmente desejaram os roteiristas, os produtores e o diretor.

Divagações postadas por Kollision entre 17 e 23 de Agosto de 2007