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Filmes Vistos em Maio - Parte 3

Maria Antonieta (Sofia Coppola, 2006) 6

Com: Kirsten Dunst, Jason Schwartzman, Judy Davis, Rip Torn, Asia Argento

Maria Antonieta, conforme a visão da diretora Sofia Coppola, possui um quê de frugalidade que se dilui ao longo das duas horas de duração do filme na rotina de um rei e de uma rainha completamente despreparados para governar uma das maiores nações do mundo. Tanto a austríaca Maria Antonieta (Kirsten Dunst) quanto o rei Luís XVI (Jason Schwartzman) são retratados como dois adolescentes sem qualquer noção de responsabilidade. Sua ignorância é fator decisivo na origem da Revolução Francesa, que terminaria por engolir e acabar com a monarquia em alguns dos últimos episódios de barbárie medieval registrados na história moderna. Coppola deixa tanto a barbárie quanto a pobreza de fora de seu filme, um produto lapidado para a personalidade fútil da jovem rainha e embalado por músicas modernas que, incrivelmente, ajudam a melhorar seu ritmo. A boa interpretação de Kirsten Dunst acentua as disparidades de um regime quase surreal em sua cegueira política e econômica, uma vez que nenhum resquício do sofrimento do povo francês é colocado em cena.

Em tempo: Maria Antonieta ainda sofreria mais três anos após a cena que encerra o filme, antes de ser decapitada pelo novo estado emergente.

Caçados (Darrell James Roodt, 2007) 5

Com: Bridget Moynahan, Peter Weller, Carly Schroeder, Jamie Bartlett, Conner Dowds

A posição de estrelas deste tipo de filme geralmente acaba ficando com os animais, principalmente quando a história envolve a revolta da natureza contra a estupidez do homem. E estupidez é a palavra de ordem na jornada de uma família que se torna vítima de um bando de leões famintos num safári na África. O roteiro é absurdo, e faz de tudo para obedecer à estruturação básica que dita a colocação de obstáculos no percurso do(s) protagonista(s). Deixando as exigências narrativas de lado, é preciso reconhecer que as cenas com os animais são feitas de forma decente, e que o diretor sul-africano Darrell Roodt consegue algum bom suspense aqui e ali. O final, no entanto, é uma piada de mau gosto. Ainda bem que as presenças refrescantes de Bridget Moynahan e da ninfeta Carly Schroeder ajudam a fazer o tempo passar entre um ataque e outro dos leões assassinos.

Robinson Crusoé (Luis Buñuel, 1954) 7

Com: Dan O'Herlihy, Jaime Fernández, Felipe de Alba, Chel López, José Chávez

Grande personagem da literatura de aventura, Robinson Crusoé ganha aqui uma de suas inúmeras releituras cinematográficas, com um grande e curioso diferencial. O diretor é ninguém menos que Luis Buñuel, um dos cineastas mais inquietos da história. Mesmo com o filme sendo falado em inglês e com a linearidade inerente ao texto de Defoe, alguns traços do cinema de Buñuel são perceptíveis, principalmente quando o protagonista se vê às voltas com a religião. O filme sofre em seu início, com a rotina solitária do náufrago escravagista Robinson Crusoé (Dan O'Herlihy) aprendendo a sobreviver numa ilha aparentemente deserta. A chegada de uma tribo de canibais e o relacionamento que surge entre Crusoé e um deles (Jaime Fernández) coloca a história em movimento, num dos raros momentos de franco otimismo dentro da carreira de Buñuel.

Proibido Proibir (Jorge Durán, 2006) 7

Com: Caio Blat, Maria Flor, Alexandre Rodrigues, Edyr Duqui, Raquel Pedras

Dois amigos universitários dividem um apartamento e estudam na UFRJ. Apesar de competente, o médico residente feito por Caio Blat vive se drogando e não consegue evitar o flerte com a namorada do amigo e sociólogo feito por Alexandre Rodrigues. A moça (Maria Flor) convence o primeiro a ajudar a família de uma paciente de leucemia em estado terminal (Edyr Duqui), e é só aí que a história passa de fato a ganhar algum foco, num conto que até então se mostra perdido. A tensão do triângulo amoroso é bem construída, apesar de pender demais para as partes em conflito, e o panorama geral faz uma crítica dura a uma realidade social cada vez mais deturpada, onde nossas convicções são postas à prova dentro de um insustentável ambiente de barbárie urbana. Só não gostei do desfecho, que nesse caso poderia ter sido um pouco menos inconclusivo.

Sociedade Secreta (Rob Cohen, 2000) 5

Com: Joshua Jackson, Paul Walker, Leslie Bibb, Hill Harper, Craig T. Nelson

O mistério que se esconde dentro das paredes das fraternidades secretas norte-americanas é o que move este suspense mediano. Rapaz brilhante mas pobre (Joshua Jackson) agarra com unhas e dentes a chance de entrar para os "Skulls", uma das mais ricas e fechadas sociedades secretas e entrada garantida para uma carreira profissional brilhante. Só que a sedução proporcionada por um mundo de prazeres quase ilimitados é interrompida pela morte trágica de um amigo. O diretor Rob Cohen tenta fugir dos clichês que emergem da estética adolescente, sem conseguir muita coisa. Ainda assim o filme fez sucesso, pois acabou ganhando nada menos que duas continuações.

Cão Sem Dono (Beto Brant e Renato Ciasca, 2007) 8

Com: Júlio Andrade, Tainá Müller, Luiz Carlos V. Coelho, Marcos Contreras, Roberto Oliveira

Da falta de perspectivas e da inércia destrutiva que marcam a rotina do tradutor Ciro (Júlio Andrade) fica quase impossível acreditar que uma beldade como Marcela (Tainá Müller) possa fazer parte. A impossibilidade de tal relacionamento, inicialmente rechaçado por ele (de forma silenciosa e conivente) e cegamente cultivado por ela é uma dúvida que os autores-diretores fazem questão de trabalhar de forma intimista, contemplativa e um pouco incômoda. Até que ponto a influência de alguém é capaz de colocar uma pessoa catatônica em movimento? Que garantia existe para uma felicidade vividamente ilusória, que para se concretizar precisa flertar com a aniquilação completa? O paralelo entre o drama do eterno adolescente e a presença tolerada do cão que não tem nome mescla-se a reflexões diversas sobre o vazio existencial e sobre a importância de família e amigos, numa crônica sólida com ótimas interpretações, baseada em relato originado de um blog e filmada sem firulas.

Batismo de Sangue (Helvécio Ratton, 2007) 7

Com: Caio Blat, Daniel de Oliveira, Léo Quintão, Odilon Esteves, Cássio Gabus Mendes

Batismo de Sangue é um trabalho de fundo histórico com um punhado de interpretações viscerais do ótimo elenco. Cobrindo um dos períodos negros da história brasileira moderna, o filme centra o foco num grupo de frades dominicanos que decidiu apoiar os esforços contra a ditatura e o terror instaurados no país no final dos anos 60. Ele é bastante realista na representação das torturas sofridas pelos acusados de comunismo, com produção e edição caprichados. Todos os atores brilham em cena, mas Cássio Gabus Mendes está peculiarmente sinistro na pele de um delegado implacável. A seriedade política do roteiro é o que de mais contundente já foi feito sobre o tema no Brasil, e só é diminuída quando ele decide se debruçar sobre o calvário pessoal do personagem feito por Caio Blat.

Divagações postadas por Kollision entre 28 e 31 de Maio de 2007