Revisto em DVD em 8-JUL-2007, Domingo
Mais do que muitos blockbusters lançados na mesma época, a refilmagem de Guerra dos Mundos é um trabalho que merece ser visto na grande sala escura. O filme perde muito do seu impacto na tela pequena, e com isso o drama mundano da família liderada pelo pai relutante feito por Tom Cruise transparece mais facilmente em meio às sensacionais seqüências de destruição proporcionadas pelos alienígenas malvados que querem dominar a Terra. A boa mão de Spielberg sobre a narrativa e a técnica é o maior atrativo de uma história fantástica, que infelizmente soa batida e não acrescenta nada para quem espera algo diferente do filme de 1953 ou do texto do livro de H. G. Wells.
O segundo disco da edição dupla do DVD vem com um extenso material de making-of, distribuído em 11 especiais de 7 minutos a meia hora que discorrem sobre as várias fases da produção, incluindo entrevistas com os descendentes de H. G. Wells.
Texto postado por Kollision em 7/Julho/2005 –
Acredito que ninguém seria melhor que Steven Spielberg na cadeira de diretor da refilmagem do hoje clássico Guerra dos Mundos (Byron Haskin, 1953). Que cineasta, no cinema contemporâneo, tem em seu currículo um número maior de feitos que Spielberg, quando o assunto é extra-terrestres e afins? Dificilmente será possível apontar um nome. E ainda mais difícil seria acreditar que ele não estivesse à altura da tarefa, ainda mais quando se olha para trás e a mais evidente constatação sobre o filme da década de 50 é que ele era então atual e até mesmo instigante, mas extremamente mal escrito e deficiente.
A tragédia destes dois filmes saiu da cabeça do escritor H. G. Wells, autor do livro no qual a história se baseia. A história, em si, é um dos raros casos em que o desafio de transposição para o meio cinematográfico constitui uma arapuca que ferra com os realizadores de um jeito ou de outro. A fidelidade ao livro traz um sabor amargo ao final da jornada, e sabe-se lá se qualquer alteração mais deliberada seria ou não capaz de deturpar completamente a idéia original. A melhor coisa a se fazer, no caso, é desligar a mente, relaxar os sentidos e desfrutar o espetáculo aprimorado de destruição, capitaneado por um dos melhores cineastas da atualidade e estrelado por ninguém menos que o astro-produtor Tom Cruise.
Não há mudanças significativas no conceito por trás da primeira versão filmada de Guerra dos Mundos. Uma sucessão de estranhos raios caindo ao mesmo tempo e nos mesmos lugares ao redor do mundo é rapidamente seguida pela aparição de gigantescas naves trípedes que saem do solo. Cruise é o pai de família Ray Ferrier, que recebe da ex-esposa (Miranda Otto) os filhos Rachel (Dakota Fanning) e Robbie (Justin Chatwin) para passarem um final de semana em sua casa. Ausente e distante, é só quando o desespero causado pelas máquinas entra em suas vidas que ele passa de fato a se interessar pela prole em meio a uma desesperada fuga das naves assassinas, que promovem uma destruição sem precedentes e reservam aos humanos capturados um destino simplesmente hediondo.
Característica recorrente nos filmes de Spielberg, o foco de Guerra dos Mundos é a relação entre pais e filhos, ao invés do esforço bélico empreendido para conter a ameaça do espaço, a espinha dorsal da versão antiga dirigida por Byron Haskin. As forças armadas são reduzidas por Spielberg a meros coadjuvantes da espetacular pirotecnia e da invencibilidade da tecnologia alienígena. A família de Ray Ferrier acaba servindo de pano de fundo para a devida atualização de época, que coloca a ameaça terrorista no lugar do comunismo e mantém o foco da tragédia exclusivamente sobre Ray e, por conseguinte, sobre os Estados Unidos.
Há pelo menos uma falha absurda do roteiro (câmera digital funcionando após a explosão de um devastador pulso eletromagnético) e algumas passagens pouco convincentes (como a visita do olho alienígena no porão do abrigo). Felizmente, o filme consegue manter o pique quase todo o tempo, calcado praticamente somente em seqüências de morte e destruição. Toda a violência é filmada com a sutileza característica de Spielberg, claro, assim como algumas ousadas e espetaculares tomadas mise en scene, especialmente o passeio da câmera ao redor do carro da família Ferrier em fuga. As nuances emocionais do personagem de Tom Cruise são bem exploradas no início e no final, o astro faz seu dever direitinho e recebe ainda a estranha companhia de Tim Robbins na metade final da história. Dá para se medir a força com que a ameaça alienígena é concebida e mostrada pelo desfecho do conflito entre o pai desesperado Ray e o paranóico Tim Robbins, pois ninguém vai sequer se lembrar de fazer qualquer julgamento moral após o corte da cena.
Curiosidade: o casal protagonista da primeira versão cinematográfica (Gene Barry e Ann Robinson) reaparece aqui como os sogros de Tom Cruise. Quanto ao final do filme e à eventual salvação da humanidade, não há muito o que se dizer além do que eu já mencionei no segundo parágrafo deste texto.