Revisto em DVD em 29-ABR-2012, Domingo
Eu me lembro quando O Chamado, a refilmagem norteamericana, estreou nos cinemas. Acreditem, o filme foi um fenômeno. Isso foi antes do novo horror japonês ser desovado no ocidente, um fenômeno que aconteceu graças a – exatamente – O Chamado.
De lá para cá já se passaram mais de dez anos, um intervalo mais do que propício para uma bem-vinda revisão. E o que dizer do filme então? O Chamado ainda é provavelmente o melhor filme da antes promissora carreira de Gore Verbinski. A história continua interessante e a cinematografia permanece como espetacular exemplo de um estilo soturno e lúgubre, pilar essencial aos melhores trabalhos do gênero. Em muitos aspectos o filme é superior ao original japonês. No entanto, após tantas cópias e tantos outros longas de horror mais ou menos similares, a saturação temática se instalou e o impacto se perdeu um pouco, até mesmo para quem assiste ao filme pela primeira vez. Ou será tudo culpa da mídia VHS, que hoje em dia está ainda mais obsoleta que na época em que o filme foi lançado?
Texto postado por Kollision em 28/Março/2005
O abismo entre culturas é quebrado muitas vezes por umas poucas similaridades, que acabam abrindo brecha para a subseqüente troca de experiências que indubitavelmente enriquece todos os envolvidos. É absorvendo as melhores características de outras culturas que uma sociedade pode evoluir de verdade. Da língua à vestimenta ou da arquitetura à ciência, até mesmo o cinema é capaz de se beneficiar disso tudo, e a maior prova do que acabo de escrever é O Chamado, refilmagem americana de um longa japonês de sucesso estrondoso lançado em 1998. Fascinados pelo terror nipônico, então tão incomum a olhos ocidentais, os produtores americanos souberam acertar o alvo quanto a adaptar a história, melhorar o clima e levar a cabo a simples mas nem sempre tão fácil tarefa de elevar o patamar de qualidade de algo que já fôra criado anteriormente.
O diretor Gore Verbinski, que não tivera uma carreira nada proeminente até então, assina o comando da fantasmagórica viagem por um conto macabro de morte e vingança. Ela começa da maneira mais trivial possível (principalmente para uma produção americana): duas adolescentes conversam fiado sobre uma espécie de lenda urbana, uma perturbadora fita de vídeo que, uma vez assistida, é seguida pelo toque do telefone, onde uma voz de menina diz que a(s) pessoa(s) que a assistiu(ram) morrerá(ão) em 7 dias. Um doce para quem adivinhar o que acontece então. Entra em cena a repórter Rachel Keller (Naomi Watts, alavancada pelo hype de seu sucesso anterior, o intrincado Cidade dos Sonhos de David Lynch), que passa a investigar a cada vez mais estranha morte de sua sobrinha. Pondo as mãos na fita, Rachel vivencia exatamente o que as lendas contam, e se joga numa corrida contra o tempo para desvendar o mistério por trás das imagens que assistiu e da presença cada vez mais constante da fantasmagórica figura da garotinha do filme em sua vida. Tudo se complica ainda mais quando ela acaba arrastando para seu pesadelo o próprio filho (David Dorfman) e o antigo namorado (Martin Henderson).
Verdade seja dita, vários fatores se combinam para tornar O Chamado uma obra com um diferencial atraente. A introdução é um primor de técnica cinematográfica, um verdadeiro show de construção de suspense engendrado por um Verbinski altamente inspirado. O impulso inicial é destilado ao longo do filme numa narrativa elegante, nunca monótona, e marcada por uma fotografia lúgubre, fria e saturada, à qual a trilha melancólica de Hans Zimmer vem a somar-se de forma esplêndida. A competência com que o pacote é apresentado se sobrepõe às escorregadas do roteiro e a algumas cenas irrelevantes.
The Ring, que é o título original do filme, pode tanto fazer alusão ao chamado em si, ou seja, o toque do telefone trazendo uma mensagem da morte, quanto à tremulante figura do círculo que aparece na fita amaldiçoada. Aliás, imagens subliminares de círculos estão espalhadas em todos os cantos da película. Ao contrário da versão original do filme, que dava mais valor ao terror psicológico, esta tenta emendar os pontos ao final para dar um significado ao termo. A maioria das pontas soltas que permanecem com certeza ficaram para possibilitar o engate de uma continuação, que viria de fato a ser realizada, dirigida desta vez pelo homem que concebera o filme original (Hideo Nakata).
Mesmo americanizado e reformulado para a platéia ocidental, O Chamado supera o filme que o inspirou em quase todos os quesitos. O original Ring - O Chamado foi um marco do cinema de horror oriental mas, além de mais bem produzida, a cópia americana tem melhor ritmo e é dotada de uma trama mais coesa. Naomi Watts faz o dever de casa certinho, em papel que quase caíra nas mãos de Jennifer Connelly e Kate Beckinsale. A concepção da vilã, que já era ótima no original, atinge aqui o status de grande ícone do moderno cinema de terror, e com certeza não será tão cedo que a garotinha de cabelos compridos caindo sobre o rosto sairá das mentes da platéia.
O especial de 15 minutos na seção de extras é uma espécie de colagem de cenas excluídas, cenas alternativas e galeria de fotos. Há ainda o trailer de Prenda-Me Se For Capaz, além de um segredo interessante escondido no menu principal. Colocando-se o cursor sobre a última opção do menu (que dá acesso ao trailer) e apontando-se para baixo, o cursor some. Ao acionar esta opção, o DVD desabilita as funções do controle remoto e mostra o vídeo maldito na íntegra, com uma surpresinha interessante ao final.