Apenas alguns anos antes de Paris ser varrida pela Revolução Francesa e ver seus poderosos serem levados ao cadafalso e à guilhotina, houve no interior da França um episódio que ainda hoje é motivo de mistério. Disposto a fornecer uma versão para ele, o cineasta Christophe Gans romantizou o fato e reuniu uma equipe de filmagem bastante eclética para combinar aventura, romance, artes marciais e horror em O Pacto dos Lobos, filme que chamou a atenção do mundo inteiro por ser uma realização capaz de se igualar a e até mesmo superar o padrão americano de realização no gênero. Realizado com competência, a superação vem sob a forma visualmente arrebatadora de retratar a história, numa fita declaradamente aventuresca.
O mistério que assolou a região rural de Gévaudan era pura e simplesmente uma fera, uma besta que dizimara aproximadamente 200 pessoas e que homem nenhum foi capaz de capturar. Tomada por um lobo, ela espalhou o terror nas comunidades locais. Preocupado com a repercussão do caso, o rei Luís XV envia o ex-soldado e naturalista Gregoire de Fronsac (Samuel Le Bihan) para solucionar o caso. Acompanhado por seu irmão de sangue Mani (Mark Dacascos), um índio americano de aura mística e expert em artes marciais, Fronsac empreende uma investigação que toma rumos inesperados devido à natureza quase sobrenatural da criatura. Apesar de se deitar sem pudor com a prostituta Sylvia (Monica Belucci), ele se apaixona pela bela Marianne (Émilie Dequenne), despertando a atenção do irresponsável e impetuoso irmão da moça, o nobre Jean-François (Vincent Cassel).
É revigorante saber que aventuras de qualidade como O Pacto dos Lobos podem ser realizadas longe dos estúdios milionários de Hollywood. Num gênero que de tempos em tempos se renova, geralmente à medida que a forma de fazer cinema dá um salto no campo dos efeitos visuais, este filme é muito bem-sucedido em utilizar as técnicas mais modernas em prol de um material que tem conteúdo, o que por si só já um grande diferencial em relação à maioria das aventuras lançadas nos últimos anos. A cinematografia lembra demais as obras mais fantasiosas de Tim Burton, e há inúmeras referências espalhadas ao longo de toda a película (logo em sua primeira cena, por exemplo, é quase impossível não se recordar da clássica seqüência do primeiro ataque da fera de Tubarão). A atmosfera resultante é extremamente adequada, já que o filme não hesita em adicionar elementos de horror à trama. A combinação de artes marciais aos combates físicos é estranha, mas empolga nos poucos momentos em que é utilizada.
Felizmente, a aparente falta de tato do diretor Christophe Gans com os atores (muitas vezes referida nos extras do disco) não impediu o bom desempenho do elenco. Mark Dacascos adiciona algum conteúdo aos inúmeros personagens de artes marciais rasteiros que costuma fazer, e o visual aquilino e andrógino de Vincent Cassel já o torna uma ameaça desde a primeira cena em que o ator aparece. Belucci e Dequenne são duas belíssimas atrizes que se revezam em papéis importantes dentro do filme. O protagonista Samuel Le Bihan tem uma evolução interessante ao longo da história, incorporando muito de heróis similares na concepção de Grégoire de Fronsac, um homem racional e muito à frente de seu tempo.
A Europa Filmes disponibilizou uma agradável coletânea de extras em seu DVD: dois making-ofs de quase 10 minutos cada com cenas de bastidores, textos discorrendo sobre o mistério da fera de Gévaudan, biografias de Christophe Gans e de seus principais atores e entrevistas que vão de 6 a 11 min. com o diretor, Vincent Cassel, Samuel Le Bihan, Monica Belucci e Mark Dacascos, além de trailer, teaser e spot de TV da produção e os trailers de O Dom da Premonição, 3.000 Milhas para o Inferno e Cidade dos Sonhos.
Texto postado por Kollision em 10/Setembro/2005