Cinema

Assombração

Assombração
Título original: Gwai Wik
Ano: 2006
País: Hong Kong, Tailândia
Duração: 108 min.
Gênero: Terror
Diretor: Oxide Pang Chun (Diário Mortal, Assassino Sem Sombra), Danny Pang (Os Mensageiros)
Trilha Sonora: Payont Permsith
Elenco: Angelica Lee, Siu-Ming Lau, Qiqi Zeng, Lawrence Chou, Rain Li, Jetrin Wattanasin
Distribuidora do DVD: Playarte
Avaliação: 3

Revisto em DVD em 14-JUL-2013, Domingo

Num determinado ponto de Assombração (não, não é o ponto onde realidade se separa de ficção), o paradigma existente acerca do gênero necessita ser quebrado, ou a percepção acerca do filme estará fadada à pior opinião possível. Em outras palavras, Assombração é na verdade um drama travestido de história de terror. Teria sido essa a intenção dos irmãos Pang ao conceber o filme? Sim, o cerne do drama pode ser percebido a léguas de distância, mas quando ele ocorre não dá para não se sentir devastado pelo modo como a revelação acontece. De resto, os que valorizam trabalhos lynchianos se sentirão desafiados após o desfecho da história.

O DVD da Playarte inclui na seção de extras um making-of de 11 minutos, 8 minutos de cenas excluídas e os trailers de Serpentes a Bordo, Efeito Borboleta 2, A Espada Sem Sombra e O Massacre da Serra Elétrica - O Início.

Texto postado por Kollision em 14/Agosto/2006

Fica cada dia mais distante a idéia de que dá para se esperar uma volta dos irmãos Pang à boa forma que eles demonstraram em The Eye - A Herança, trabalho que os tornou relativamente conhecidos dentro do círculo de apreciadores do cinema de horror. Eles voltam a utilizar como protagonistas da história a mesma dupla de atores de The Eye, num roteiro fantasioso que remete imediatamente ao conto de Alice no País das Maravilhas, mas se perde completamente a meio caminho. Nem vou mencionar a criatividade sempre impressionante da distribuidora brasileira, e seu assombroso dom (perdoem-me pelo trocadilho, não resisti) na tradução dos títulos de filmes estrangeiros lançados por aqui.

A escritora de um romance extremamente bem-sucedido Chu Xun (Angelica Lee) anuncia junto com seus editores a publicação de seu novo livro, uma história sobrenatural intitulada "Assombração". Xun tem que conciliar o retorno de sua antiga paixão (Lawrence Chou) enquanto sofre de bloqueio criativo. A aparição cada vez mais freqüente de um vulto feminino em seu apartamento é o gancho que ela usa para iniciar seu conto macabro, que se funde à realidade ao seu redor até o ponto em que ela se vê imersa num universo decrépito, onde cadáveres vagam aos montes e as regras da física não mais se aplicam. Um velho misterioso (Siu-Ming Lau) e uma garotinha (Qiqi Zeng) são as únicas pessoas como ela presas nesta estranha realidade, um lugar hostil do qual Xun parece ser incapaz de escapar.

Com uma premissa interessantíssima, o filme dos Pang converte-se de um promissor e climático conto de horror num drama desastroso, pontuado por passagens que não sabem se querem assustar ou provocar compaixão. É uma combinação estranha e visualmente ousada, disso não há dúvida. O resultado, porém, é decepcionante. Há um abuso quase anormal de efeitos especiais, todos eles concentrados na viagem do além da personagem principal, que chupa sem dó nem piedade do design artístico de outros filmes infernais como Constantine (Francis Lawrence, 2005). A estética de Alice é levada às últimas conseqüências, em seqüências episódicas que quebram o ritmo ao tentar ditá-lo e cansam o espectador no trecho que antecede o clímax da história. A aparente obsessão dos diretores por fetos humanos (presentes também na trama de Visões, de 2004) entrega muito do que está por vir, e simplesmente não consegue o efeito desejado após toda a luta empreendida pela heróina da história.

Assombração merece ao menos uma conferida básica por um ou dois motivos, atraentes somente para os aficcionados do gênero e do horror oriental. A seqüência em que a protagonista abandona o computador e desce o elevador do prédio acompanhada de uma menina e uma velha é um primor isolado em meio ao grande equívoco que é o filme. Outro diferencial pequeno é a perda de terreno do típico vilão feminino de cabelos escorridos, que cede espaço para uma horda de zumbis putrefatos que garantem alguma atmosfera nos momentos mais tensos do longa. A trilha sonora de Payont Permsith é boa enquanto o filme permanece na esfera do suspense, e descarrila quando a baboseira sentimental irrompe como um petardo de inadequação. E não é o final espertinho que vai salvar a película, sinto muito dizer. Existe a idéia de que aquele universo macabro, que mais parece o inferno na Terra, seja uma criação da mente zoada da própria escritora. Mas também existe algo chamado propósito, coisa que o filme simplesmente abandona muito antes de chegar à sua cena final.

E pode parecer bobagem, mas aqui é possível matar a curiosidade em saber como é que os orientais usam computadores com teclado ocidental para escreverem seus ideogramas. Às vezes nem tudo é uma perda completa nesse mundo, já diziam os primeiros sábios da humanidade...