Primeiro, a fama: o que se ouve falar desse filme é que ele foi o grande responsável por impulsionar o cinema independente dentro da indústria, atraindo a atenção de grandes estúdios, críticos e público para os longas realizados com pouco recurso, mas talento e estilo de sobra; trata-se também do trabalho de estréia dos incensados irmãos Coen, realizadores de filmes bem-acabados, marginalmente acessíveis e sempre associados a bizarrices e ao rompimento das regras até então estabelecidas no suspense, na comédia, no drama.
O respeito que os Coen obtiveram com este filme pode ser medido pela quantidade de astros que conseguiram atuar ou que ainda desejam conseguir uma vaga no elenco de um de seus longas. De George Clooney a Tom Hanks, que chegaram a atuar sob a batuta dos caras, passando por muitas figurinhas tarimbadas de Hollywood que dariam muito mais que um olho para estar no elenco de seu próximo trabalho, a questão que sempre pairava no ar para mim era se toda essa euforia tinha de fato alguma razão de ser. Porque meu aprendizado dos Coen começou de trás pra frente, e eu simplesmente não consegui engolir a embromação gigante e superestimada que se chama Fargo (1996), até hoje o filme mais premiado da duplinha de ouro do cinema independente.
Depois de assistir a Gosto de Sangue, injustamente chamado por alguns de "ensaio para Fargo" (dane-se o fato de este último ter sido feito bem depois), acredito que posso ao menos compreender a tal euforia. Isso porque o desejo de realizar um bom filme logo na primeira tacada, associado a um roteiro original e interessante, faz de Gosto de Sangue um surpreendente "suspense de erros". A história subverte o material de um autêntico film noir numa trama de assassinato atípica, imprevisível e jamais enfadonha. Personagens agem com base no que ouviram dizer, esperam mais das reações de seus comparsas do que de suas próprias artimanhas e acreditam estar fazendo tudo certinho, sem saberem que confiar pode ser (e é, neste caso) uma faca de dois gumes.
Os quatro jogadores desta farsa perigosa são o dono de bar Marty (Dan Hedaya), sua esposa Abby (Frances McDormand), seu empregado Ray (John Getz) e o detetive particular Lorenz (M. Emmet Walsh). Abby se entrega numa relação extra-conjugal com Ray, mas é observada de perto por Lorenz, contratado por Marty para seguir seus passos. A merda vai pro ventilador quando, atormentado pelo par de chifres que lhe pesa na cabeça, Marty negocia com Lorenz para que ele mate a esposa e o amante sem-vergonha. Contar mais do que isso com certeza estragaria o prazer da viagem maluca de sangue e mal-entendidos engendrada por Joel e Ethan Coen, num filme que não decepciona e realmente fica à altura da fama que possui.
De extras o DVD só tem um material em texto discorrendo sobre a versão do diretor editada pelos Coen anos depois do lançamento original do filme (é esta a versão presente no DVD da Europa Filmes), suas biografias e um trailer feito para o relançamento.
Visto em DVD em 28-AGO-2006, Segunda-feira - Texto postado por Kollision em 1-SET-2006