Espécie de reflexão utópica e macabra sobre a arte de escrever para o cinema, este trabalho dos irmãos Coen extrapola um enredo inicialmente simples, flertando com os filmes de serial killer e com um surrealismo disfarçado de desorientação (ou seria o contrário?). É uma amostra emblemática do tipo de cinema que hoje é quase uma marca registrada de Joel e Ethan Coen, famosos por tecerem histórias aparentemente banais que sempre trazem um quê de bizarro e as distanciam do caldo dominante nos filmes do gênero.
A história se passa em 1941. Barton Fink (John Turturro) é um escritor bem-sucedido no teatro novaiorquino, que é contratado por uma produtora de Hollywood para escrever um filme sobre luta livre. Visivelmente desconfortável com a mudança de ares, Fink acaba se alojando num hotel de segunda classe e passa a sofrer de um bloqueio que o impede de escrever. Uma improvável amizade surge com o vizinho corpulento do apartamento do lado (John Goodman), enquanto a pressão dos executivos do estúdio (Michael Lerner e Tony Shalhoub) coloca-o em situações cada vez mais estapafúrdias à medida que seu prazo se aproxima do fim, principalmente quando ele conhece um escritor que admira (John Mahoney) e sua prestativa secretária (Judy Davis).
Não dá para falar mais sobre o filme sem entregar as surpresas que pipocam na tela após a primeira hora de projeção. O ponto de ebulição da história é tão definido que é possível dividir Barton Fink em duas partes: antes e depois do sangue. O 'antes' corresponde à monotonia de um escritor em crise, numa condução cadenciada e contemplativa. O 'depois' estraçalha o 'antes' e põe a platéia na ponta da poltrona, acompanhando a reviravolta maluca da vida de Fink com ares cada vez mais surreais.
O cinema de espírito independente dos Coen carrega uma crítica nem sempre aparente, cheia de referências e ácida a ponto de favorecer o protagonista o tempo todo para, depois, tirar-lhe o chão da pior forma possível. A relação do dramaturgo Barton Fink com o universo da produção cinematográfica é marcada por uma sensação que mistura confusão, inexperiência, perplexidade, ilusão e empolgação cega, num retrato nada piedoso sobre os executivos que comandam os estúdios. No mundo dos roteiristas concebido pelos Coen, idéias são encorajadas com a mesma facilidade com que são destroçadas, infladas e influenciadas por gente que às vezes não entende nada do que está fazendo. Poucos são os filmes que rivalizam com este em sua representação de alguma engrenagem do universo cinematográfico, para isso vejam Crepúsculo dos Deuses (Billy Wilder, 1950) e Cidade dos Sonhos (David Lynch, 2001).
Com um trecho final onde nada é o que parece ser, a jornada do escritor Barton deixa a simplicidade banal para adentrar um reino desesperador onde cada quadro e ação significa algo mais. Superada a primeira hora de projeção, infelizmente um tanto enfadonha, o filme torna-se um mistério capaz de deixar o espectador pensando por dias.
Os extras do DVD resumem-se a uma galeria de fotos da produção e oito cenas excluídas, totalizando cerca de 11 minutos.
Texto postado por Kollision em 16/Junho/2005