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Percepções iniciais do universo enófilo
Passados alguns meses desde que resolvi me iniciar de verdade no universo dos vinhos, chegou o momento de dizer que muita coisa básica já mudou na minha percepção da bebida. Dentro desse mundo repleto de aromas, sensações e combinações as nuances e variações são virtualmente infinitas, mas já é possível me pronunciar a respeito – ou ao menos compartilhar, com cautelosa parcimônia, as impressões que tenho colhido e registrado em nosso diário de degustações.
Antes disso, uma breve recapitulação sobre fundamentos teóricos.
Como mencionado no post número zero sobre vinhos, tomada a decisão de me aprofundar no assunto uma das primeiras coisas que fiz foi adquirir alguns livros. Devorei-os rapidamente, a maior parte deles durante a madrugada em meio a uma obra. Ao mesmo tempo, associei a leitura a constantes pesquisas na Internet, gerais e específicas sobre os vinhos que estávamos degustando. Assinei duas revistas especializadas: a Decanter, bíblia mensal inglesa que tenho recebido desde Abril, e a Adega, publicação mensal nacional que passei a receber um pouco mais tarde. Também fiquei sócio do ClubeW Classic, que tem revista mensal própria.
Barahonda Bodegas, Sin Madera Monastrell, Yecla DO 2011 (Espanha)
Degustado numa noite de rolha livre no Varadero Bar & Restô, acompanhando uma entrada chamada "Quarteto Paulista"
Como podem imaginar, a overdose de informação foi extrema no início, mas já é possível perceber resultados no modo como sou capaz de utilizar o vocabulário enófilo.
Compartilho abaixo algumas das impressões gerais que tenho após alguns meses inserido "dentro" deste mundo. Espero poder revisá-las ou ampliá-las num futuro breve.
- Existe, sim, o tipo de vinho mais adequado a cada ocasião, seja solo ou acompanhando comida.
- Vinho não é bebida para se tomar sozinho. Metade da alegria em se degustar um vinho está em fazê-lo na companhia de outras pessoas, conversando e, se possível, apreciando um belo prato.
- O excesso de detalhes em indicações sobre harmonização de vinho e comida é geralmente inútil, pois há muitos fatores que podem influir na apreciação de uma refeição regada a vinho. Basta saber as linhas gerais – o resto fica por conta da ocasião, da experiência e do prazer que a combinação é capaz de proporcionar.
- A percepção de alguns vinhos se altera completamente quando eles são degustados com comida. A maioria melhora, alguns poucos pioram. Neste último caso, trata-se claramente de uma harmonização malsucedida.
- A ideia do ritual de degustação de um vinho (avaliar cor, aroma e paladar na taça) é mais simples do que se imagina, mas leva tempo para ser aperfeiçoada em todos os pequenos detalhes.
Finca Las Moras, Pacha-Mama Torrontés, San Juan 2014 (Argentina)
Apreciado com uma rodada de queijos, frutas secas e geleias
- A esmagadora maioria das avaliações críticas profissionais de vinhos se alonga demais e descamba para encheção de linguiça. No fim, o que conta mesmo para mim é a percepção acerca de aromas, taninos, álcool, acidez e corpo. Tudo deve pender para o equilíbrio.
- Dito isso acima, é possível com alguma prática desenvolver o "dom" de descrever as percepções sensoriais proporcionadas por um vinho. Alguns adjetivos são mais fáceis de compreender: aveludado, suculento, encorpado, terroso. Só que eu ainda não entendo o próposito por trás de palavras como "crocante". Já elegante é algo bastante relativo: há uma diferença gritante entre servir um branco num copo americano sobre uma mesa de bar ou numa taça Riedel enquanto a garrafa descansa num requintado balde de gelo.
- Descrever a cor dos vinhos é uma empolação desnecessária e, também, encheção de linguiça. Metade do que você lê na Internet sobre a cor de vinhos tintos refere-se a "vermelho rubi com reflexos violáceos". Pode ser que eu seja meio daltônico, mas para mim bastam as nuances de vermelho e púrpura e o grau de transparência. Sobre os brancos, algo entre a limpidez absoluta e o fim da linha no amarelado.
- Temperatura é extremamente importante. Principalmente para os brancos.
- A taça é extremamente importante. Principalmente para os tintos.
- Vinho de supermercado pode ser tão bom quanto vinhos de boutique. Basta saber escolhê-los.
- Vinhos devem descansar por um tempo após a compra antes de serem abertos. De preferência na posição horizontal, pelos motivos normalmente mencionados como impedir a entrada de ar, possibilitar a correta micro-oxigenação e manter a rolha molhada. A não ser que seja um vinho de longa guarda considero este último item como o mais importante, pois não existe nada mais triste para um enófilo do que se deparar com uma rolha ressecada se despedaçando durante a abertura da garrafa.
- A maioria das pessoas tende a avaliar melhor vinhos mais caros ou com rótulos mais bonitos, muito embora vinhos mais baratos possam ser melhores ao seu paladar.
- Complementando a informação acima e repetindo o que já mencionei, a apreciação de um vinho é bem mais positiva quando ele é compartilhado socialmente.
- Para muita gente o vinho (e todos os rituais em torno dele) é demonstração de status. Dependendo da ocasião isso não deixa de ser verdade, mas tal constatação não é motivo para que a pomposidade e a enochatice predomine.
Provam, Varanda do Conde Alvarinho/Trajadura, Vinho Verde DOC 2013 (Portugal)
Acompanhando um bacalhau ao forno no restaurante DiParma Originale
A seguir coloco algumas de minhas atuais preferências:
- Minha casta tinta preferida é a Sangiovese.
- Minha casta branca preferida é a Torrontés.
- Em linhas gerais, na minha opinião o país com produção mais fascinante é a Itália. É de lá que vêm as garrafas de sabor mais marcante e diferenciado.
- Não gosto de abrir uma garrafa para terminá-la no dia seguinte. Ou abre para degustar tudo ou não abre.
E agora aponto uma pequena lista de tarefas:
- Decidir-me finalmente por uma adega climatizada após muita pesquisa.
- Abandonar a birra por espumantes. Aqui em casa ninguém é muito chegado ao estilo.
- Convencer a esposa a apreciar alguns rótulos rosé. Já conseguimos vencer a birra do Merlot (adquirida em experiência tenebrosa no Uruguai).
- Comprar algumas garrafas de vinho de sobremesa (doce).
- Desenvolver mais sensibilidade no uso de decanters para aeração dos vinhos.
Cono Sur, Bicicleta Cabernet Sauvignon, Valle Central 2013 (Chile)
Fantástico acompanhamento para um fondue chinoise no Chalé do Fondue, em Chapada dos Guimarães
Na próxima postagem sobre o assunto espero escrever sobre minhas impressões acerca dos aspectos mercadológicos relacionados a vinho.
Texto postado por Edward em 4 de Julho de 2015