Visto em DVD em 3-DEZ-2006, Domingo - Texto postado por Kollision em 8-DEZ-2006
A curta parceria entre Jesus Franco e a musa Soledad Miranda teve um fim trágico em agosto de 1970, quando ela morreu num terrível acidente automobilístico em Portugal. Este filme, cujo título americano é She Killed in Ecstasy, representa o último e mais tardiamente lançado trabalho de Soledad. Tido como uma refilmagem livre de Miss Muerte, o que só pode ser considerado verdade em bases muito amplas, é um emblemático prelúdio para o que seria uma carreira iluminada para a atriz. Feito na mesma época e com praticamente a mesma equipe de Vampyros Lesbos, a obra se enquadra numa categoria bastante distinta dentro da filmografia de Jesus Franco, definida quase que exclusivamente pela figura hipnótica de Soledad Miranda.
Sendo obras praticamente gêmeas sob o ponto de vista da produção, Vampyros Lesbos e este filme costumam ser associados estilisticamente, o que é um erro. Sie Tötete in Ekstase é bem mais acessível que sua contraparte, tem uma narrativa até convencional e vem com uma dose ainda maior de ousadia no quesito erotismo. Os meandros sobrenaturais inexistem, e até mesmo o trabalho de câmera mais convencional e bem acabado serve para diferenciar os dois filmes. Para os não-iniciados no universo instável de Jesus Franco, Sie Tötete in Ekstase me parece uma primeira experiência consideravelmente mais recomendada que Vampyros Lesbos.
Um médico jovem e visionário (Fred Williams) tem a vida destruída ao ver sua pesquisa com embriões humanos ser brutalmente rejeitada e proibida pelo conselho de medicina (formado por algumas figurinhas tarimbadas da galeria de atores de Jesus Franco – o próprio, Howard Vernon, Ewa Strömberg e Paul Muller). Completamente desiludido, o médico comete suicídio e deixa sua amada (Soledad Miranda) sozinha na mundo. Dominada pela angústia e pelo desejo de vingança, ela inicia uma cruzada de matança contra aqueles que destruíram seu relacionamento, seduzindo-os um a um e eliminando-os em terríveis acessos de fúria.
O que o espectador espera de um filme de assassinato com carta livre para muitas cenas de nudez e seqüências marcadas por beleza plástica sem igual é o que este longa-metragem entrega. Adicione aí lesbianismo e algumas coisas mais bizarras, como uma incômoda menção à necrofilia. O que mais transparece no estilo de Franco ainda são suas escolhas interessantes de ângulos de cena e iluminação, seu tino para retratar a beleza única de Soledad Miranda e sua generosidade nas tomadas de natureza pseudo-erótica. Soledad, com sua silhueta de Valentina de Crepax, quase como uma versão mais suave e bela de Barbara Steele, mesmeriza somente por desfilar diante das câmeras do diretor. O virtuosismo cênico exacerbado não era uma prioridade na cartilha de Jesus Franco na época, mas as artimanhas típicas do período, como a profusão de zooms e a trilha sonora de um jazz deslocado e contrastante, estão lá para justificar a aura B que o filme possui como uma gema rara deste sub-gênero.
Acredito que todos concordam que o ponto mais baixo da película é mesmo o seu final, apressado e insatisfatório. Se para isso houve alguma influência da triste partida de Soledad Miranda deste mundo, só Franco é quem sabe. Indelével mesmo é a impressão que se tem dela, que aqui demonstrava o potencial para se tornar uma ótima atriz, dentro ou não do gênero que a consagrou.
O trailer é o único extra disponível no DVD, que traz o filme com áudio em alemão e legendas em inglês.