O romance à moda antiga de Jane Austen volta a encontrar transposição de peso nesta adaptação de um de seus mais famosos livros. Mais ou menos como em Razão e Sensibilidade (Ang Lee, 1995), o tema recorrente é a saga de jovens moças na busca por um amor que vá (ou não) de encontro àquilo que é socialmente aceito. Lembremos que, neste filme, a ação se situa na aurora do século XIX, e as motivações de sua personagem principal derivam de uma necessidade mais pura que aquela da obra anteriormente adaptada por Lee. A pompa permanece a mesma, para o bem dos admiradores da prosa da escritora.
A história gira em torno da jovem Elizabeth Bennett (Keira Knightley), a segunda filha de um casal de camponeses, de um total de nada menos que cinco adoráveis moças. Sua mãe (Brenda Blethyn) vive em função de arranjar um casamento rentável para cada uma delas, que nem sempre podem se beneficiar da sabedoria do passivo pai (Donald Sutherland). Num dos inúmeros bailes da região, Elizabeth trava contato visual com o cínico, arrogante, intragável e rico Sr. Darcy (Matthew Macfadyen). Independente, inteligente e admiradora de literatura, ela tenta de todas as formas dissimular sua inegável atração pelo erudito rapaz, que pode perder a vez com a chegada do primo dela, o Sr. Collins (Tom Hollander), que almeja tomá-la em breve como sua esposa.
O filme é um programa de razoável eficiência romântica, e corresponde com mérito ao conceito hoje tão esquecido do ritual amoroso marcado por nobres galanteios, significância de olhares, prosa poética, fascinação pelo mistério e desejos sufocados. É quase um anacronismo em tempos de sexo casual e do festival de futilidades que norteia as vidas da maioria dos jovens, principalmente aqueles de culturas ocidentais. É inocente em seus propósitos, com uma evidente valorização de diálogos e a sempre louvável índole de ouro de uma protagonista que transmite inspiração sem se desvincular de uma caracterização plausível.
De execução estilosa e fotografado com a necessária delicadeza, o trabalho do diretor Joe Wright lamentavelmente exagera ao enfocar os anseios das irmãs mais jovens da heroína Elizabeth, cujos tremeliques chegam a encher o saco durante a primeira metade do filme. Tais situações chegam a render momentos de certo apelo humorístico, mas somente quando entra em cena a Sra. Bennett de Brenda Blethyn. O exagero, contudo, está lá, e só não toma conta de tudo graças à extraordinária presença de Donald Sutherland, excelente como o pai de família conformado com sua situação financeira, mas maravilhado pela personalidade decidida e inquieta de Elizabeth. Knightley e Macfadyen fazem um par adorável, principalmente devido às diferenças aberrantes em suas atitudes, mas é óbvio que o título Orgulho e Preconceito se aplica com muito mais propriedade a ele, um aristocrata tolhido por seus costumes e torturado por uma paixão improvável, mas arrebatadora.
No geral, é preciso dizer que o elenco do longa talvez seja o seu ponto mais forte. O nanico Tom Hollander serve mais uma vez ao propósito de personificar o típico inglês pateta, mantendo a competência que lhe é peculiar. Um bônus interessante é a aparição tardia da sempre admirável Judi Dench, que se revela aqui uma tenebrosa pedra no sapato da protagonista.
Texto postado por Kollision em 23/Fevereiro/2006