Cinema

Persona

Persona
Título original: Persona
Ano: 1966
País: Suécia
Duração: 83 min.
Gênero: Drama
Diretor: Ingmar Bergman (A Hora do Lobo, Vergonha, A Paixão de Ana)
Trilha Sonora: Lars Johan Werle
Elenco: Bibi Andersson, Liv Ullmann, Margaretha Krook, Gunnar Björnstrand, Jörgen Lindström
Distribuidora do DVD: Versátil Home Vídeo
Avaliação: 9

Até que ponto alguém está disposto a desistir das convenções sociais que ditam o comportamento das pessoas é somente um dos pontos em que esse enigmático filme de Ingmar Bergman toca. O que leva uma pessoa a desistir de ser, a abdicar de falar, a conviver apenas consigo mesma e encarar o mundo por trás de uma cortina de inexplicável indiferença? O que leva alguém a dar tamanha vazão aos pensamentos, que estes chegam a se fundir à realidade e dela não mais podem ser dissociados? De onde vem tamanha força interior, e para onde ela leva? O que acontece quando é somente aos olhos do criador que a criatura encontra sentido?

Conhecido também sob o título de Quando Duas Mulheres Pecam, Persona faz parte da categoria de grandes quebra-cabeças cinematográficos de cunho surreal. Um tipo de filme que jamais será alvo da mesma interpretação por duas pessoas diferentes. Para quem também viu o recente Cidade dos Sonhos (David Lynch, 2001), a associação entre as duas obras é quase inevitável. Há duas mulheres, há uma enorme tensão sexual entre elas e, a partir de determinado ponto na história, há uma subversão de papéis que não faz concessões ao espectador atônito, que se pega tentando aplicar um molde de compreensão a algo que talvez não tenha sido concebido com tal objetivo em mente.

Bibi Andersson, colaboradora habitual de Bergman, desempenha no filme o papel da enfermeira Alma, encarregada de zelar pela saúde da atriz de teatro Elisabeth (Liv Ullmann). Elisabeth está há três meses sem falar, após ter sofrido um colapso nervoso que começou numa de suas apresentações no palco. Ela é acompanhada por Alma em todos os momentos, e as duas se tornam ainda mais próximas quando decidem se instalar numa casa de campo na praia, com o objetivo de apressar a melhora da atriz. Elas se afeiçoam uma à outra, enquanto Alma compartilha com Elisabeth seus segredos mais bem guardados e é tragada para uma relação desgastante, em que sua personalidade aos poucos sucumbe à tirania silenciosa de sua companheira.

O trecho final do parágrafo acima já faz parte da minha interpretação para o filme, a qual, devo confessar, ainda não é cem por cento definitiva. Quanto mais eu penso, mais enevoada fica minha opinião, e menos fica claro que a primeira impressão seria a mais acertada. Bergman ajuda e confunde o espectador em vários momentos, como na abertura surreal e fascinante, fonte de inspiração para milhares de outras bizarras seqüências de montage que vieram após ela. A última cena do filme fecha o ciclo iniciado por sua abertura, mas não conclui nada a respeito de suas personagens principais. Sou inclinado a pensar que essa — spoiler - clique aqui se quiser lê-lo Elisabeth, até certo ponto, era uma pessoa real. Alma, ao mudar-se sozinha para a casa na praia, transportou a figura da atriz para o seu cotidiano solitário e gradualmente se tornou vítima de uma série de ilusões e de uma inevitável loucura – o maior exemplo disso é a cena em que o marido cego de Elisabeth (Gunnar Björnstrand, em participação de luxo) vai visitá-la, e Alma supostamente assume o lugar da amiga como sua esposa – bem, o cara pode ser cego, mas com certeza não deixaria de reconhecer o corpo de sua própria mulher. E o menino que aparece no início poderia ser o fruto abortado da relação sexual de Alma com os estranhos da praia... — é uma de minhas interpretações para o filme (a mais abrangente, pelo menos). Que, sei lá, com certeza pode mudar após uma eventual revisão.

Sendo um drama de assimilação difícil, os atrativos maiores do filme estão mesmo no aspecto intrincado da história – convite mais do que suficiente para quem aprecia obras no estilo – e nas excelentes performances de Liv Ullmann e Bibi Andersson. Ullmann é muito bonita, e de certa forma chega a roubar a cena de Andersson no quesito beleza. Seria esta outra sutileza escolhida a dedo por Bergman em seu árido estudo da psicologia feminina? Creio que sim.

Os extras deste DVD se resumem ao trailer americano do filme e a uma galeria de fotos, acompanhados da usual biografia curta do diretor sueco.

Visto em DVD em 10-SET-2006, Domingo - Texto postado por Kollision em 13-SET-2006