A palavra jarhead, pelo que indica este novo trabalho do aclamado britânico Sam Mendes, pode se referir tanto ao corte de cabelo característico dos milicos do exército quanto a eles próprios. Não deixa de ser um título adequado para a história de um destes soldados dentro de um dos mais recentes conflitos armados do mundo, a operação Tempestade no Deserto, levada a cabo pelos Estados Unidos na década de 90 contra um cada vez mais problemático Iraque comandado por Saddam Hussein.
O soldado em questão é o milico Swofford (Jake Gyllenhaal), um jovem de cujo passado não se fica sabendo muita coisa, o que basicamente insere-o no grosso das estatísticas militares sobre o contingente arrastado para a guerra. Indo parar no exército após "se perder no caminho para a faculdade", ele é logo colocado num seleto grupo de atiradores de elite dos fuzileiros, comandado pelo severo sargento Sykes (Jamie Foxx), e do qual também faz parte o calmo e enigmático Troy (Peter Sarsgaard), seu parceiro de campo. Trocando em miúdos, o filme é o relato do treinamento e da campanha de seu batalhão no Kuwait e no Iraque.
Acredito que uma das maiores qualidades dos trabalhos de Sam Mendes está na capacidade do diretor em capturar a unidade e o significado global de uma história. O domínio cênico e narrativo também transparece de forma esfuziante, seja através da excelente fotografia ou de suas composições de cena de cunho quase artístico. Afinal, é possível tornar o deserto escaldante e as planícies petrolíferas em ameaçadora combustão em algo belo de se ver? Se depender de Mendes, sim. Basta dizer que Soldado Anônimo é mais um dos casos em que o filme é visualmente estonteante, de encher os olhos mesmo. O trecho final da história, particularmente, contém algumas das mais belas tomadas já feitas em filmes de guerra.
Quanto à mensagem e à posição política do longa, a coisa é um pouco diferente. Tanto o ufanismo quanto a agressividade em relação ao inimigo são reduzidos a breves diálogos auto-contidos, que em nenhum momento influem no andamento da história ou no destino dos personagens. Pouco importa se eles estão no Oriente Médio para proteger os interesses econômicos dos EUA pelo petróleo, ou se tudo se resume ao heroísmo fraternal entre nações. Muitos estão ali por falta de opção mesmo, e alguns lentamente se dão conta de que é apenas no exército que eles chegam a ter algum valor como membros da sociedade. O conflito maior está na ansiedade com que o momento de decisão se aproxima, se os milicos terão o que é preciso para ir em frente e como isso virá a afetar suas vidas após o retorno ao lar. Não há nada muito mais complicado que isso.
O desempenho do elenco principal é ótimo, mas bem que Jamie Foxx poderia ter sido mais durão em determinadas cenas. Alguns leves excessos emotivos por parte da trilha sonora aparecem aqui e ali na primeira metade do filme, mas não é nada que chegue a maculá-lo de forma considerável. Convencional para uma obra de guerra com tamanho valor de produção, Soldado Anônimo ainda aproveita o tema para reverenciar obras anteriores como Nascido para Matar (Stanley Kubrick, 1987), colocando ainda uma palhinha de Apocalipse Now (Coppola, 1979) para animar os fuzileiros prestes a ir a campo. Nada mais apropriado para disfarçar as longas e tediosas horas passadas em vão em meio à areia cortante do Oriente Médio.
Texto postado por Kollision em 22/Janeiro/2006