As videotecas ou bibliotecas cinematográficas existentes em todos os lugares do mundo deveriam seriamente pensar em criar uma nova categoria de filme para catalogação de acervo, se esta ainda não existir. Refiro-me à categoria de filmes ruins. Ruins MESMO. Podem pertencer a um gênero definido, mas são de tal forma aberrantes que deveriam ser promovidos a uma prateleira especial e lá deixados apenas com propósitos didáticos, para futuros cineastas aprenderem como um filme não deve ser feito.
A fama de Ed Wood não é segredo algum para qualquer cinéfilo que se preze. Cada filme do famigerado diretor é tão ruim em sua essência, que se torna diferente à sua própria maneira. Glen ou Glenda, por exemplo, é um festival bizarro, A Noiva do Monstro um deleite de terror trash, e Plano 9 do Espaço Sideral um marco do pior e, ainda assim, do mais cômico que a ficção científica produziu até hoje. Em comum, os três filmes possuem uma característica escapista que os distanciam de qualquer avaliação realista. Então, o que pode ser dito de A Face do Crime, um film noir com gangsters como pano de fundo, roteirizado, produzido e dirigido por Ed Wood?
A história gira em torno de dois bandidos de meia-tigela que andam armados e assaltam cinemas, padarias e lojas de esquina. Um deles, filho de um proeminente cirurgião plástico, acaba preso mas é solto pela própria família, que tenta em vão convencê-lo a sair da vida marginal. O outro é um genuíno malfeitor com nada de bom no coração. As coisas complicam quando o filho do médico acaba assassinando um policial durante um dos assaltos mirabolantes da dupla. Perseguido e investigado pela polícia, ele busca a ajuda do pai enquanto tenta lidar com o gênio instável do parceiro estourado.
Não se deve deixar enganar pela sinopse da história, que na capa do DVD é referida como uma "obra-prima", que é inspirada no popular programa de TV Dragnet e é resultante de uma gloriosa tentativa de seguir os filmes de gangster como Scarface. De desenvolvimento completamente desinteressante e carente de qualquer nome conhecido (Steve Reeves, que seria o futuro Hércules, não conta), A Face do Crime é uma tortura de pouco mais de uma hora que na verdade parece durar três. As interpretações sofríveis, o desleixo técnico característico do diretor e as ridículas tentativas de criar suspense só conseguem dar sono, sendo que a reviravolta final só surpreende mesmo quem dormiu durante a metade do filme. E se ainda resta alguma dúvida do quanto esta "obra" é ruim, basta prestar atenção na trilha sonora. Horrível, a música se resume a um mesmo zumbido irritante durante todo o tempo de projeção!
Todos os outros filmes de Ed Wood, seja por seus elementos fantásticos ou por figuras curiosas presentes no elenco, apresentam um diferencial que os torna ao menos dignos de uma sessão. Os defensores do cineasta podem espernear à vontade, mas não há nada que salve A Face do Crime do fundo do poço. Nem mesmo os extras do DVD, que se resumem ao trailer, biografias de Ed Wood e de Dolores Fuller e um arquivinho de fotos e pôsteres.
Texto postado por Kollision em 27/Novembro/2004