Um estilo mais reconhecível e palpável toma forma no cinema de Jean Rollin neste seu terceiro filme, que volta a utilizar o vampirismo como pano de fundo. Muito embora as presas, marca registrada dos vampiros, tenham sido completamente abolidas pelo diretor nesta obra, ela une um esboço de narrativa com cenários de cores saturadas, um trabalho de câmera distinto, um erotismo leve, uma boa dose de nudez feminina e uma direção de atores deliberadamente estilizada, constituindo uma entrada interessante no sub-gênero. O filme é conhecido fora da França por uma gama enorme de títulos alternativos, dentre os quais o mais famoso é The Shiver of the Vampires.
Dois jovens recém-casados interrompem sua viagem à Itália e param num castelo no interior da França a pedido da noiva (Sandra Julien), que deseja reencontrar os primos que não vê há muito tempo. O noivo (Jean-Marie Durand) aceita a sugestão para agradá-la, mas a visita se transforma numa experiência bizarra quando eles chegam e descobrem que os dois proprietários do castelo acabaram de falecer. Recepcionados por duas estranhas empregadas que permanecem no lugar (Marie-Pierre Castel e Kuelan Herce), os pombinhos acabam envolvidos numa teia de rituais vampíricos liderada pela enigmática Isolde (Dominique), dos quais também participam os supostos primos mortos (Michel Delahaye e Jacques Robiolles), dois hippies metidos a filósofos.
A julgar pelo aspecto único e oscilatório do estilo de Rollin, que definitivamente não se prende a amarras narrativas ao conceber sua alegoria sobre vampiros, o filme representa uma experiência que pode ser fascinante ou desapontadora, dependendo do estado de espírito da platéia. A confusão que domina o início da história pode até não ser proposital, mas é um ingrediente vital no estabelecimento do clima etéreo e onírico que permeia o longa, que só encontra mesmo um ritmo característico em seu trecho intermediário. Em seu último terço a história volta a patinar, apresentando uma resolução surrealmente forçada para as situações criadas e dando liberdade completa à platéia para maiores divagações.
Le Frisson des Vampires, acima de tudo, entrega a sua origem tipicamente francesa. A certa altura, por exemplo, eis que há uma extensa seqüência de diálogos declamados pela dupla de vampiros hippies, que discorrem acerca de história e religião como se estivessem numa palestra. O óbvio contraste entre a cena e o restante do filme, que prima por longas seqüências sem praticamente nenhuma fala, provoca a sensação de altos e baixos que acaba prevalecendo no final. Os altos ficam por conta do elenco feminino, da trilha sonora bacana que não exagera no jazz desconjuntado (um vício às vezes irritante dos cineastas europeus contemporâneos de Rollin) e da ousadia técnica do trabalho de câmera, que abusa de pans horizontais e verticais e revoluções de 360°. A bela protagonista Sandra Julien é quem mais tira a roupa, enquanto a tal de Dominique encarna uma vampira que protagoniza uma cena que entra direto para o panteão das grandes passagens do gênero: aquela em que ela sai de dentro de um relógio de parede, o mesmo onde Rollin faz uma tomada que varre o corpo de Sandra Julien de cima abaixo apenas alguns minutos mais tarde, quando a moça ansia pelo retorno da vampira que acabara de seduzi-la.
São passagens emblemáticas como essas que garantiram a fama do cineasta, que neste filme demonstra estar em boa forma no que diz respeito a narrativas que não prescindem da tão característica veia onírica dos filmes europeus de sua época.
O DVD de região 1 da Image Entertainment vem com áudio original em francês, com legendas opcionais em inglês. Os extras consistem dos trailers francês e americano do filme (neste último sob o título de Strange Things Happen at Night), além de uma galeria de fotos animada.
Visto em DVD em 4-FEV-2007, Domingo - Texto postado por Kollision em 8-FEV-2007