Seqüência direta do clássico Drácula, um dos pilares do cinema de horror da era falada, A Filha de Drácula dá vida a uma história que extrapola o conceito criado por Bram Stoker em seu famoso romance, e surpreende pelo enfoque humanista dado à casta dos sugadores de sangue. Seu diretor, Lambert Hillyer, foi um cineasta essencialmente dedicado à realização de faroestes, com poucos filmes fora deste gênero em particular. A história da herdeira da linhagem transilvânica maldita foi um deles e, mesmo que a obra careça da magia do capítulo anterior, é preciso dar ao filme seu devido crédito.
Continuando exatamente de onde havia parado, a história começa com o professor Van Helsing (Edward Van Sloan) sendo capturado pela Scotland Yard e acusado do assassinato do conde Drácula e do alucinado Renfield. Decidido a manter sua versão fantástica dos fatos, ele requisita a ajuda de um ex-aluno em sua defesa, o renomado psiquiatra Jeffrey Garth (Otto Kruger). Entrementes, o corpo de Drácula é roubado e uma pintora estrangeira se instala na cidade, a condessa Marya Zaleska (Gloria Holden). Auxiliada pelo servo Sandor (Irving Pichel), a aristocrática artista, que não é outra senão a filha de Drácula, vê em Jeffrey uma oportunidade para se livrar de sua maldição de uma vez por todas, ou talvez afundar ainda mais nas trevas do além-mundo.
Para uma seqüência que poderia ter sido desenvolvida com um enfoque mais ousado no macabro, este filme decepciona. O direcionamento do roteiro, na realidade, é completamente oposto, e inclui na trama o desejo genuíno que a filha de Drácula tem de se ver livre de sua maldição secular. A consumação do vampirismo é tratada como o lado negro de um vício terrível, ao qual a condessa sucumbe mas do qual se arrepende mais tarde. Seu servo humano é mais sanguinário e tenebroso que ela, ansiando pelo dia em que ganhará o dom da vida eterna e relembrando-a freqüentemente (como na cena ao piano) a que realidade ela de fato pertence. Está aí algo que, apesar de não satisfazer quem aguardava uma carga maior de presas e sangue, decididamente apresenta uma interessante faceta do drama vampírico.
Pode-se dizer, portanto, que o filme é bacana. Tem um bom ritmo, uma trilha sonora razoavelmente arrepiante e uma protagonista das trevas perfeitamente caracterizada que antecipa, em várias aspectos, a matriarca Mortícia da Família Addams. A austeridade de Gloria Holden torna sua atitude diante do heróico Otto Kruger ainda mais dúbia. Estaria a condessa interessada no médico apenas profissionalmente ou em um nível mais carnal? O instinto sexual é ainda mais sutilmente cutucado na seqüência em que a vampira ataca uma jovem (Nan Grey) capturada por seu servo nas imediações. A metáfora da libido é extremamente forte, assim como a punição da sexualidade, tanto física quanto psicológica. No lado do bem, a tensão existente entre Jeffrey e sua espevitada secretária (Marguerite Churchill) é o único aspecto mais leve que funciona a contento na película, que se equivoca ao inserir precocemente um inadequado senso de humor em suas passagens iniciais.
O filme vem num DVD em edição conjunta com a versão espanhola de Drácula (George Melford, 1931), e traz como único extra relacionado o trailer de cinema.
Visto em DVD em 12-NOV-2006, Domingo - Texto postado por Kollision em 16-NOV-2006