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Filmes Vistos em Março - Parte 2

Exponerad (Gustav Wiklund, 1971) 4/10

Com: Christina Lindberg, Heinz Hopf, Björn Adelly, Siv Ericks, Janne Carlsson

A.K.A. Exposed — Em início de carreira, a musa underground Christina Lindberg é o chamariz maior desta produção irregular. O mais interessante é que o ponto de partida da história não é de todo ruim: adolescente entediada (Lindberg) aceita fazer uma sessão fotográfica de nudez com um homem que acaba de conhecer (Heinz Hopf), mas a seguir passa a ser chantageada por ele em troca de favores sexuais. Desesperada, ela recorre ao namorado careta (Björn Adelly) em busca de ajuda, o que não chega a ser muito útil. Essas linhas de sinopse não são entregues de forma linear, e peço perdão se por acaso alguém achar que entreguei demais da trama. A não-linearidade do início do filme é o que de mais decente ele possui, uma vez que o gás do roteiro vai dimuindo de tal forma que o diretor passa a encher linguiça da metade para o final. A maior prova disso é a inserção bastarda de um longo e inexplicável trecho de um filme norte-americano do Tarzan (!) que não encontra qualquer respaldo temático na história. Desinibida como sempre, Lindberg não está muito bem em sua representação dos desejos mundanos materializados em impulsos emocionais, mas as cenas em que sua personagem "imagina" o desfecho de determinadas situações compensam essa deficiência da moça com relativo êxito.

Vale da Morte - A Vingança de Bloody Bill (Byron Werner, 2004) 0/10

Com: Chelsea Jean, Gregory Bastien, Scott Carson, Denise Boutte, Matt Marraccini

Quando essa porcaria começa, os créditos estilosos e o prenúncio de que o tema principal será zumbis passam uma impressão até razoável. Seguem as atrozes introduções do elenco jovem da vez, um grupo de estudantes que ruma para uma competição maluca com o professor mas é obrigado por um traficante de beira de estrada a se enfiar num vilarejo fantasma à procura do parceiro desaparecido do cara. A pegadinha é que a vila é dominada pelo espírito do tal Bloody Bill, um assassino sulista morto por linchamento que arrebanha novas vítimas para seu exército de mortos-vivos. Não é preciso ir muito além da introdução para perceber que estamos estamos diante de um desastre cinematográfico da pior estirpe, uma lástima completa e amadora que nem como diversão trash consegue se salvar. Os diálogos são indescritíveis de tão retardados, o aproveitamento de cenários é feito de forma imbecil e a edição parece ter ficado a cargo de um estagiário acéfalo que acabou de fazer um mini-curso de Windows Moviemaker. Não existe nada capaz de redimir essa porcaria. Não há senso de ritmo, personagens são magicamente clarividentes, as mulheres passam o tempo todo vestidas e os zumbis não sabem como devem se comportar: uma hora estão se arrastando e logo a seguir correndo como se estivessem disputando os 100 metros rasos. Sim, tenha medo, muito medo.

O Monstro do Mar Revolto (Robert Gordon, 1955) 5/10

Com: Kenneth Tobey, Faith Domergue, Donald Curtis, Ian Keith, Chuck Griffiths

Mais um dos muitos produtos surgidos do medo da ameaça atômica na prolífica década de 50, O Monstro do Mar Revolto é lembrado como um clássico devido aos efeitos especiais em stop motion proporcionados por Ray Harryhausen em início de carreira. O que aconteceria com um ser descomunal que habita as profundezas quando ele fosse bombardeado pela radioatividade remanescente dos testes nucleares? É o que o comandante de um submarino (Kenneth Tobey) e uma dupla de cientistas (Faith Domergue e Donald Curtis) descobrem quando surgem indícios de que há uma monstruosidade do tipo rondando as águas costeiras dos Estados Unidos. A ênfase em explicações de fundo científico é um dos pontos altos da história, que no entanto peca por dar uma importância equivocada ao cavalheiresco (e insosso) triângulo amoroso formado pelos protagonistas. A criatura marinha, um polvo descomunal, destrói construções enormes e espalha pânico na população, e Ray Harryhausen faz milagres com o pouco que lhe foi oferecido de recursos na época. O processo de colorização da obra até que não é de todo ruim, e apesar de tê-la visto em sua fotografia original creio que assisti-la em cores não me parece algo tão herético assim.

Cannibal Holocaust (Ruggero Deodato, 1980) 9/10

Com: Robert Kerman, Carl Gabriel Yorke, Francesca Ciardi, Perry Pirkanen, Luca Barbareschi

Tirando talvez o infame Império dos Sentidos (Nagisa Oshima,1980), nenhum outro filme dos anos 80 foi tão controverso quanto Cannibal Holocaust, que finalmente ganhou uma edição nacional em DVD. Como ela não tem sido muito divulgada, cá estou eu fazendo a minha parte!

Um dos mais comentados filmes de horror já realizados, Cannibal Holocaust carrega uma aura de maldito por vários motivos, mas o principal deles é provavelmente o escândalo que se seguiu ao seu lançamento. Preso e acusado de assassinar o elenco principal durante as filmagens, o diretor Ruggero Deodato se viu obrigado a convocá-los perante a corte e quebrar um contrato que os obrigava a permanecer anônimos por no mínimo um ano, com o óbvio objetivo de aumentar a especulação em torno da natureza do filme. Muito adiante de seu tempo, o roteiro envolvia uma equipe de documentaristas norte-americanos que desaparece na selva amazônica ao realizar um trabalho sobre uma tribo de índios canibais. Disposto a encontrá-los, um professor de antropologia (Robert Kerman) decide percorrer o mesmo caminho que eles fizeram, e nos rolos de filme que são então recuperados estão imortalizados os estarrecedores eventos que vitimaram o grupo.

Violento, irrestrito, notoriamente desprovido das amarras sociais vigentes na época e ainda assim realizado com uma competência que o coloca muito acima do nível geral associado às produções de terror de baixo orçamento, Cannibal Holocaust é um filme pesado, destinado a plateias de mente aberta. Tirando o hype criado com o passar dos anos, que obviamente é o fator principal para tanto tabu, o que o torna único é o realismo que Deodato consegue extrair de todo o seu elenco (sem exceção, dos protagonistas aos canibais), assim como o esmero técnico com que ele concebe as cenas de violência e canibalismo/carnificina. Não se enganem e não se deixem levar pelo rótulo trash, pois trata-se de um filme tecnicamente muito bom. Tão bom que levou muita gente a acreditar que o que está nas imagens aconteceu de verdade. O mais impressionante é que a história não envelheceu nada de lá pra cá, e coloca no chinelo muitos longas/dramas de horror feitos hoje em dia. Quando um trabalho de tamanho teor subversivo dá um tapa tão grande na cara da sociedade dita "civilizada", fica difícil não reconhecê-lo como o grande filme que é.

Mais do que as crueldades feitas contra seres humanos, que são obviamente (muito bem) encenadas, o que mais me chocou no filme são as cenas de assassinato de animais. Essas sim são tristes, e por mais que tenhamos a consciência de que diariamente milhares de animais são mortos nas mais diferentes culturas para satisfazer a fome da humanidade, é difícil se distanciar e permanecer impassível diante de coisas como a cena da morte da tartaruga. Diz Ruggero Deodato que se arrependeu de tê-las filmado. Como o DVD nacional traz o filme supostamente sem cortes, está aí a chance para conferir estas e muitas outras passagens que fizeram a fama daquele que é, com certeza, o mais controverso filme cult de horror de todos os tempos.

E não custa avisar: se você se impressiona facilmente, evite.

O Circo (Charles Chaplin, 1928) 8/10

Com: Charles Chaplin, Merna Kennedy, Al Ernest Garcia, Harry Crocker, Henry Bergman

Último filme completamente mudo de Chaplin, O Circo também ocupa um lugar inóspito em sua filmografia por ser o mais subestimado de todos eles, talvez até mesmo por seu próprio criador. Desta vez, o vagabundo é perseguido pela polícia e encontra refúgio num circo dominado por um mestre de cerimônias ranzinza (Allan Garcia) que maltrata todo mundo, em especial a própria filha trapezista (Merna Kennedy). Carlitos se enamora da garota, vira a sensação cômica do picadeiro e no final se estranha com um rival equilibrista (Harry Crocker). Este é definitivamente o filme de Chaplin com o maior número de gags visuais, numa sequência quase ininterrupta de patacoadas cômicas que fazem rir até hoje. O contraste com a melancolia do vagabundo é feito de forma um pouco menos cruel daquela vista nos filmes mais conhecidos do cineasta, e o personagem ganha até um certo contorno de nobreza cavalheiresca no desfecho da trama. A trilha sonora da nova versão foi composta (e cantada no caso da música de abertura) pelo próprio Chaplin, quando este já tinha 80 anos. Há várias sequências memoráveis no filme, mas minhas favoritas são aquela em que o vagabundo entra no picadeiro correndo do policial e a entrevista de trabalho em que ele atormenta o dono do circo. Clássico!

Divagações postadas por Edward de 24 a 31 de Março de 2010