Cinema

A Queda - As Últimas Horas de Hitler

A Queda - As Últimas Horas de Hitler
Título original: Der Untergang
Ano: 2004
País: Alemanha, Áustria, Itália
Duração: 156 min.
Gênero: Drama
Diretor: Oliver Hirschbiegel
Trilha Sonora: Stephan Zacharias
Elenco: Bruno Ganz, Alexandra Maria Lara, Juliane Köhler, Corinna Harfouch, Ulrich Matthes, Heino Ferch, Christian Berkel, Matthias Habich, Thomas Kretschmann, Michael Mendl, André Hennicke, Rolf Kanies, Donevan Gunia, Götz Otto, Bettina Redlich
Distribuidora do DVD: Europa Filmes
Avaliação: 8

Muitos foram os filmes já realizados sobre várias das diferentes frentes de combate envolvidas na Segunda Guerra Mundial. A esmagadora maioria deles mantém seu foco no sofrimento e nas vitórias dos Aliados, ocasionalmente se concentrando em personalidades de cunho heróico que por um motivo ou outro desempenharam um papel extraordinário na guerra. Até onde se pode listar, porém, poucos foram os filmes que ousaram retratar com fidelidade a pessoa de Adolf Hitler, mentor da Alemanha nazista e grande responsável político e militar pelo maior conflito armado de toda a história da humanidade. Sendo uma produção completamente alemã, o fato é que A Queda surge como um olhar deveras corajoso desta nação sobre uma grande chaga em sua história, uma ferida que, por mais que tenha sido esquecida e tenha eventualmente cicatrizado, ainda pulsa sob um véu de vergonha histórica que sempre será causa de desconforto para seu povo.

Assim, este filme se concentra nos últimos dias de Adolf Hitler (Bruno Ganz) antes da capitulação da Alemanha e do conseqüente final da guerra, em abril de 1945. Sob o olhar neutro e extremamente ingênuo de Traudl Junge (Alexandra Maria Lara), a última secretária pessoal do Führer, a intimidade de Hitler é descortinada em várias ocasiões distintas, como na comemoração de seu último aniversário, nas últimas reuniões estratégicas com seus generais e no progressivo desespero dentro do claustrofóbico bunker onde ele se refugiou, numa Berlim arrasada por bombas e tanques do exército russo, então em vitoriosa marcha sobre o território inimigo. O fim da era mais negra da história da Alemanha ainda é retratado sob o olhar dos oficiais e das pessoas mais próximas ao ditador, como sua amante até o fim da vida Eva Braun (Juliane Köhler), o fanático general Göbbels (Ulrich Matthes) e o grande arquiteto da era nazista Albert Speer (Heino Ferch).

Historicamente, o trabalho do diretor Oliver Hirschbiegel é de uma fidelidade impressionante às fontes mais confiáveis sobre o fim do Reich alemão. O filme é uma verdadeira aula de cinema nos departamentos técnicos, com um design de produção que recria a atmosfera de decadência do poderio militar alemão com uma assombrosa veracidade, utilizando para isso parte da cidade russa de São Petersburgo, cuja arquitetura os produtores reconheceram como muito parecida com a de Berlim na época da guerra. Está aí uma grande ironia histórica e uma amostra genuína de como os piores aspectos da guerra foram esquecidos, visto que a cidade russa em nenhum momento parece ter oferecido empecilhos à realização do filme. Muito pelo contrário. Além disso, boa parte do elenco secundário é russo. O processo de escolha do elenco principal mostrou-se também bastante seletivo ao escolher atores parecidos com os homens e mulheres que fizeram parte do drama real. A começar por Bruno Ganz, que alega ter se surpreendido após o seu primeiro teste de maquiagem.

Ganz captura a essência do monstro que foi Hitler, fugindo da caricatura freqüentemente associada aos seus discursos e confundindo a platéia ao incorporar o conhecido carisma do ditador junto às pessoas mais próximas de si. Com a austera interpretação de Ganz, Hitler involui de uma presença ameaçadora para um homem decrépito e doente em seus últimos momentos, levando consigo, na morte, muitos de seus fiéis seguidores. O papel que o povo alemão desempenha neste drama, além de ser a maior vítima de uma guerra impossível de ser vencida, encontra um retrato incômodo na linha narrativa que acompanha um grupo de jovens condecorados pelo próprio Führer, que montam uma resistência improvisada contra a invasão dos russos em Berlim. Os piores momentos, no entanto, estão reservados às crianças da família Göbbels, cujo futuro sem a existência do partido nacional-socialista jamais esteve fadado a acontecer.

Apesar da duração um pouco exagerada, o tom quase documental de certas passagens em A Queda fazem do filme uma pesada aula de história, num dos melhores trabalhos do cinema alemão nestes últimos anos. A completa ausência de personagens inimigos ou não-alemães atesta a visão histórica unilateral e, por isso mesmo, única que o filme fornece. Como esperado e sensato, não há na obra de Hirschbiegel qualquer espécie de enaltecimento ao nazismo, ou qualquer indício de algo do tipo.

O segundo disco do DVD duplo vem com um making-of de quase uma hora, 18 minutos de cenas de bastidores comentadas pela produtora e pelo designer de produção do filme, um especial de meia hora com comentários do diretor para várias cenas de bastidores, entrevistas curtas com vários membros do elenco e da equipe técnica (incluindo Joachim Fest, autor de um dos livros que inspirou o filme), uma entrevista de 8 minutos com a escritora Melissa Müller falando sobre a verdadeira Traudl Junge, biografias de Bruno Ganz, Alexandra Lara, Juliane Köhler, Corinna Harfouch e Oliver Hirschbiegel, uma entrevista em texto com o roteirista e produtor Bernd Eichinger, trailer do filme e também os trailers de Flores Partidas, O Segredo de Brokeback Mountain e Valiant.

Texto postado por Kollision em 20/Abril/2006