THX 1138 é o primeiro filme dirigido por George Lucas e também a primeira produção da American Zoetrope, estúdio fundado por Francis Ford Coppola. Realizado de forma completamente independente, como ditavam as idéias por trás do novo estúdio e pretendia o produtor Coppola, o filme acabou sendo depois mutilado pela Warner, que simplesmente detestou o produto obtido com o financiamento inicial fornecido e cortou a verba de distribuição e divulgação a quase nada. A verdade é que, se não fosse pelo mega-sucesso de Star Wars Episódio IV - Uma Nova Esperança (realizado em 1977 e mais conhecido como Guerra nas Estrelas), muito provavelmente THX 1138 estaria hoje destinado a um quase intransponível limbo cinematográfico. Partindo de um curta-metragem concebido pelo próprio George Lucas durante a faculdade, o conceito desta ficção científica de difícil assimilação tinha a intenção (segundo o mesmo) de colocar na tela o modo como Lucas enxergava a sociedade da época.
THX 1138 (Robert Duvall) é um cidadão que habita o mundo subterrâneo de um futuro indeterminado, onde todas as pessoas são designadas por códigos de três letras e quatro números, têm suas individualidades suprimidas da pior forma possível e são obrigadas a consumir drogas para se manterem fiéis a um sistema tão vazio quanto implacável com os transgressores. Nesta realidade, o sexo e o amor não têm lugar e constituem um crime hediondo, como THX e sua companheira LUH 3417 (Maggie McOmie) acabam descobrindo da pior forma possível. Em sua jornada em busca da companheira e de respostas, THX cruza com um eufórico estranho chamado SEN 5421 (Donald Pleasence), resiste às torturas da polícia organizada e se vê cada vez mais decidido a não retornar ao entorpecimento ao qual esteve submetido durante toda a vida.
Do ponto de vista estético, THX 1138 é um triunfo, construído a partir de composições e ângulos de cena ousados e originais, com uma cinematografia espetacularmente calcada na cor branca. A prisão onde o personagem principal é conduzido é um exemplo, uma espécie de 'nada' branco sem paredes, opressivo como nenhuma outra prisão com grades poderia ser. Opressivo é, na realidade, o tom que parece exalar de todas as tomadas do filme, que pode ainda ser definido como uma árida história de amor que dá errado e acaba servindo como pano de fundo para um punhado de significados ocultos, que criticam a sociedade de forma escancarada e estraçalham a religião de forma quase sacrílega.
Como no mundo de THX não existem quaisquer referenciais temporais, a liberdade criativa da equipe de produção não parece ter sido tolhida pelo orçamento reduzido. Isso é evidente no aproveitamento dos cenários e no uso eficiente do branco, como mencionei acima. A opção pelo ritmo lento acentua a desorientação de THX, e o roteiro não se preocupa muito em oferecer pistas sobre o que está acontecendo. Isso não chega a ser um problema com o protagonista e sua companheira LUH, mas atrapalha uma conexão mais clara com o personagem de Donald Pleasence, que passa uma impressão de considerável importância na sociedade para depois se comportar de forma obscura (separando THX e LUH) e incitar uma revolta entre os prisioneiros do limbo branco. Apesar dele encontrar um propósito na resolução de seu conflito, sua motivação inicial não é clara o suficiente. E o ritmo sofre um pouco com trechos que, mesmo para os padrões de lentidão logo no começo estabelecidos, resultam longos demais (como a tortura de THX na prisão).
Dá para constatar, apesar de tudo, que THX 1138 faz parte daquele seleto grupo de filmes que merecem mais de uma sessão, possibilitando assim a devida absorção e, quem sabe, uma maior apreciação do material mostrado.
No primeiro disco é possível assistir ao filme com os comentários filmados de Walter Murch, um dos papas da edição cinematográfica, sobre as técnicas usadas na edição de som (estes especiais podem ser vistos também separadamente, totalizando cerca de meia hora). O segundo disco apresenta um esclaredor documentário de 1 hora sobre o início da American Zoetrope, a versão curta de THX 1138 que Lucas fez durante a época de faculdade, dois making-ofs do filme (um mais longo e atual de 30 minutos e um mais curto, feito na época, com pouco menos de 10 minutos) e 6 trailers, sendo um deles original e os demais feitos para o relançamento da obra em sua versão remasterizada.
Texto postado por Kollision em 24/Maio/2005