Cinema

O Sétimo Selo

O Sétimo Selo
Título original: Det Sjunde Inseglet
Ano: 1956
País: Suécia
Duração: 96 min.
Gênero: Drama
Diretor: Ingmar Bergman (Morangos Silvestres, No Limiar da Vida, O Rosto)
Trilha Sonora: Erik Nordgren (Sorrisos de uma Noite de Amor)
Elenco: Max von Sydow, Gunnar Björnstrand, Bengt Ekerot, Nils Poppe, Bibi Andersson, Åke Fridell, Inga Gill, Gunnel Lindblom, Erik Strandmark, Maud Hansson, Inga Landgré, Bertil Anderberg, Anders Ek, Gunnar Olsson
Distribuidora do DVD: Versátil Home Vídeo
Avaliação: 9

Ingmar Bergman, em seu inexorável modo de retratar a realidade através de seus filmes, faz de O Sétimo Selo uma obra de considerável densidade, carregada de significados indiretos e imbuída de uma crítica corrosiva em relação à religião. O filme é tido como uma de suas obras-primas, e representa em desafio que parece se esclarecer um pouco mais a cada sessão, ainda que tudo o que seja mostrado em seus diálogos e em suas situações dê espaço às mais variadas interpretações em torno dos conceitos de morte e Deus.

Encerrando uma campanha santa de 10 anos nas cruzadas, o cavaleiro Antonius Block (Max von Sydow) retorna à Suécia acompanhado de seu escudeiro Jons (Gunnar Bjönstrand). Logo no início da jornada de volta, Antonius recebe a visita da Morte (Bengt Ekerot), que deja envolvê-lo eternamente em seu gélido abraço. No entanto, descontente com a falta de sentido de tudo o que fizera até então e disposto a buscar as respostas para as suas dúvidas, o cavaleiro desafia a Morte para uma partida de xadrez em troca de mais tempo de vida. Enquanto o jogo prossegue, a peregrinação do cavaleiro leva-o a conhecer os mais variados vilarejos e pessoas que vão constituindo um grupo e se juntam à sua viagem, em especial o casal de atores Mia (Bibi Andersson) e Jof (Nils Poppe), que têm um bebê de um ano de idade e demonstram uma alegria de viver tão intensa que contraria toda a miséria e degradação que assolam a Suécia do século XII.

Nunca a fotografia em preto-e-branco foi tão apropriada a um filme, e tão essencial à caracterização de uma história quanto em O Sétimo Selo. O título é retirado diretamente de uma das mais citadas passagens do livro das revelações, o Apocalipse, e abre e fecha o filme acompanhando a persistência da entidade que veio levar o cavaleiro Antonius para a eternidade. O personagem é o centro de um conflito que se desdobra em bolsões psicológicos e explodem como feridas pustulentas num corpo carcomido pela peste, o principal causador de toda a desgraça do povo. Numa época em que a igreja detinha o poder sobre tudo e todos, e a superstição encontrava caminho livre por entre os meandros de ignorância da população pobre, este é um dos vários períodos de decadência da humanidade que pode ser reduzido à ausência do bem e ao predomínio do mal. É isso que faz a dúvida sobre a existência de Deus aflorar no coração do antes nobre e feliz Antonius, e é através de seus olhos que Bergman demonstra o contraste entre a perda da fé e uma ínfima fagulha de esperança, enxergada pelo cavaleiro na família que com ele divide uma refeição de morangos e leite.

As passagens poéticas, como a referência explícita à última ceia na derradeira cena do filme, e a terrível procissão de flagelados pela peste que interrompe a viagem dos peregrinos, são belíssimas e ao mesmo tempo aterradoras em sua essência. Cada um dos integrantes do grupo que acaba se formando ao redor de Antonius Block parece representar algo relacionado às atribulações da alma humana, mas nenhum deles é tão eloqüente ao se encontrar com a morte quanto a companheira do escudeiro Jons, que é salva por ele de ser estuprada e permanece muda durante todo o filme. A felicidade, para ela, era se ver livre da miséria e da degradação de uma vida pela qual ela já não mais ansiava, e pela qual não nutria nenhuma esperança. Seu semblante ao encontrar a Morte não é só iluminado, é a representação do júbilo sincero que acompanha o renascimento em meio ao caos do sofrimento. Como se Bergman dissesse que a felicidade pode subsistir, mesmo diante do fim, mesmo em meio ao desespero de uma existência execrável. Se a existência pode ser assim cruel, como não se sensibilizar com o drama do cavaleiro que acredita que sua vida foi uma luta interminável e inútil?

Mesmo não sendo um filme para todos os estados de espírito, principalmente devido ao tema árido e ao aspecto depressivo que paira como uma sombra sobre a história, O Sétimo Selo justifica sua fama de clássico. Um drama belamente filmado, intrinsecamente poético, levemente surrealista e religiosamente crítico. De quantos outros clássicos pode se afirmar a mesma coisa?

O DVD traz como material adicional o trailer do filme e biografias de Ingmar bergman, Max von Sydow e Bibi Andersson.

Texto postado por Kollision em 1/Agosto/2006