Cinema

A Rosa Púrpura do Cairo

A Rosa Púrpura do Cairo
Título original: The Purple Rose of Cairo
Ano: 1985
País: Estados Unidos
Duração: 82 min.
Gênero: Comédia
Diretor: Woody Allen (Hannah e Suas Irmãs, A Era do Rádio, Poderosa Afrodite)
Trilha Sonora: Dick Hyman
Elenco: Mia Farrow, Jeff Daniels, Danny Aiello, Irving Metzman, Stephanie Farrow, Dianne Wiest, Glenne Headly, Edward Herrmann, John Wood, Deborah Rush, Van Johnson, Zoe Caldwell, Eugene J. Anthony, Ebb Miller, Karen Akers, Annie Joe Edwards, Milo O'Shea, Peter McRobbie
Distribuidora do DVD: MGM / Fox
Avaliação: 8/10

Por natureza, o verdadeiro cinéfilo é hoje em dia um ser em extinção. Refiro-me não ao freqüentador regular de cinemas, e sim àquele que ama a sétima arte de uma forma incondicional e constante, fazendo dela parte de sua vida particular com um entusiasmo muitas vezes incompreendido. É inegável que, com o advento massivo da TV, do vídeo-game e da Internet, a 'espécie' cinéfila acabou se reduzindo com o passar dos anos a um grupo restrito que parece viver em seu próprio mundo. E um mundo próprio é exatamente o que Woody Allen cria em A Rosa Púrpura do Cairo, que declama em cada uma de suas cenas uma ode de amor ao cinema, reverberando ainda hoje como um dos bons filmes que ousaram transcender a linha que separa realidade de ficção.

Durante a grande depressão americana nos anos 30, a dona de casa Cecilia (Mia Farrow) ganha a vida trabalhando como garçonete para sustentar o marido desempregado e folgado (Danny Aiello). Sua única válvula de escape é o cinema da cidade, e a mais nova sensação do lugar é o novo filme 'A Rosa Púrpura do Cairo', que por vários motivos ela assiste repetidamente. Sua fascinação é tão grande que arrebata um dos personagens da película (Jeff Daniels), que durante a projeção desce da tela de cinema e vai ao seu encontro, clamando estar apaixonado por ela. O rebuliço é geral, e não tarda a aumentar assim que a notícia chega até os ouvidos dos produtores do filme e do ator que interpreta o personagem fujão.

O desempenho do elenco é ótimo, em especial Jeff Daniels como o herói romântico e deslocado num mundo em que não foi concebido para estar. Seqüências antológicas são a sua inocente visita ao bordel local e, em especial, o momento em que ele deixa a tela em preto-e-branco do cinema e se materializa ao vivo e a cores diante de uma platéia atônita. Do outro lado, em contrapartida, os companheiros de filme do herói apaixonado também adquirem vontade própria e se acotovelam à sua espera, sem no entanto poderem transpor a fronteira do telão.

A fascinação por uma forma de arte que ainda se esforçava para se estabelecer como tal é a força motora do romance, dos conflitos e da beleza poética e metafórica concebida por Woody Allen. Não existe nenhuma grande sacada por trás da história do filme, cujo título nada tem a ver com o cerne do romance entre Cecilia e o personagem fictício que causa espanto. Trata-se de um delírio cinematográfico, uma fantasia com toques de drama e comédia que, acertadamente, se passa no período mágico que corresponde ao nascimento do cinema falado. Afinal, se fosse ambientada nos anos 80, toda a premissa seria um pouco mais difícil de engolir. Em nenhum momento a seriedade com que é recebida a entrada do herói de celulóide no mundo real é perturbada, e qualquer sensação de incredulidade é jogada pela janela a favor do triângulo amoroso que se forma quando o ator que o criou conhece Cecilia e também começa a se apaixonar por ela. Apesar do filme patinar um pouco em seu trecho intermediário, ainda bem que Allen não deixa tudo degringolar ladeira abaixo a partir daí, conseguindo encerrar algo aparentemente sem rumo de forma convincente, ainda que melancólica.

Infelizmente, o único extra que acompanha o DVD é o trailer original do filme.

Texto postado por Kollision em 25/Agosto/2005