As aulas de história geral a que todos os estudantes ginasiais são submetidos durante a adolescência podem às vezes ser fascinantes, quando ministradas por professores inspirados. Ou acabam mesmo entrando por um ouvido e saindo pelo outro, se o mestre não for lá muito inspirador e o aluno não quiser saber patavinas do que os egípcios ou os fenícios faziam há muitos anos atrás. Estre estranho filme resgata muito desse período didático, mais ou menos da forma como acabei de expô-lo. Mecânico, didático, teatral e, com o perdão da palavra, extremamente 'chato' durante quase todo o seu tempo de projeção. Compreendo que taxar um trabalho de cinema simplesmente de 'chato' é algo deveras simplista mas, infelizmente, esta é a característica que mais se aplica a Um Filme Falado.
O enredo do filme resume-se basicamente à viagem que a bela professora de história Rosa (Leonor Silveira) faz com a filha de 8 anos Maria Joana (Filipa de Almeida), partindo num cruzeiro de Portugal em direção a Bombaim, na Índia. Lá elas devem encontrar o pai da menina para partir numa viagem de férias ainda mais internacional. Ao longo do caminho, Rosa vai explicando à filha a história por trás de todos os lugares exóticos que elas visitam. Em seu caminho atravessam vários estranhos, como um padre ortodoxo (Nikos Hatzopoulos), um ator famoso (Luís Miguel Cintra) e o educado capitão do navio que as leva (John Malkovich).
O principal diferencial de Um Filme Falado é que ele destoa de vários padrões estabelecidos no cinema contemporâneo como o conhecemos. O diretor Manoel de Oliveira lança mão do básico em se fazer cinema para contar uma história que, aparentemente, não leva a lugar algum. Enquadramentos minimalistas refletem o óbvio orçamento irrisório da produção, e a quase completa ausência de tomadas em movimento, associada à interpretação forçada, teatral e irritantemente mecânica de boa parte do elenco não deixam que nenhuma expectativa seja criada ou, se existente, atendida durante praticamente todo o tempo de filme. O 'Falado' do título é levado ao pé da letra, não havendo qualquer trilha sonora exceto pela bela performance musical da grega Irene Papas.
Como a estética didática adotada pelo diretor não permite qualquer interação maior entre os personagens, o filme peca num dos pontos mais importantes em qualquer história que acredita que merece ser contada: simplesmente não há conflito! E, exceto para os fanáticos por história antiga, como filme de arte ele simplesmente decepciona pela premissa rala e sonolenta. Belas locações (independente da qualidade da fotografia), roteiro verborrágico ao extremo e nenhum conflito na primeira meia hora são meio caminho andado para garantir o naufrágio de qualquer filme. A falação é tanta que chega a ocorrer em múltiplas línguas (além do português, misturam-se na tela o inglês, o francês, o italiano e o grego), num quase interminável colóquio que parece querer dar ao passeio de mãe e filha um rumo, mesmo que minimamente interessante. Mensagem? Se havia alguma, passou a quilômetros de meu parco discernimento... A fleuma de John Malkovich vem bem a calhar, e é só por ele e pelo final bacana (ainda que, numa análise mais realista, este seja carente de uma lógica temporal mais apurada) que dou a essa tremenda enganação uma merecida nota 2.
O único conteúdo da seção de extras do DVD são os trailers de O Clã das Adagas Voadoras, As Aventuras de Marco Polo, O Sétimo Dia, Adorável Júlia, Nicotina, O Lobo, A Busca, Sahara e Nas Nuvens.
Texto postado por Kollision em 10/Agosto/2005