Alexandre, o Grande era, historicamente, filho de Filipe II da Macedônia e de Olímpia de Épiro. Nasceu em algum dia de julho de 356 a.C. e faleceu em junho de 323 a.C. Uma das figuras mais notáveis da história mundial, foi um príncipe que ascendeu a rei com a morte do pai e logo tornou-se o maior conquistador de povos de todos os tempos, liderando o exército macedônio em campanhas destruidoras do Egito à Índia. Levar a saga de Alexandre às telas era algo que já há algum tempo estava nos planos do cineasta Oliver Stone, conhecido e admirado por filmes como Platoon e The Doors. A dimensão épica da empreitada de Stone e sua equipe resultou num longa de quase três horas de duração que, enquanto obra de cinema razoavelmente satisfatória, com certeza não é unânime no quesito de fidelidade à vida do rei macedônio que construiu um império antes mesmo de chegar aos trinta anos de idade.
Alexandre é interpretado por Colin Farrell, ator que teoricamente teria a presença necessária para incorporar o quase mítico personagem-título. O filme de Oliver Stone é narrado em tom solene por um idoso Ptolomeu (Anthony Hopkins) que, soberano em parte do que sobrara do legado de seu rei, recorda a infância do prodígio, seu aprendizado com os melhores tutores da época (incluindo Aristóteles, feito por Christopher Plummer), sua adolescência e, por fim, sua sangrenta e vitoriosa campanha pela dominação do mundo conhecido. Marcada pela interferência constante de sua mãe Olímpia (Angelina Jolie) e pela relação sempre conflituosa com o pai Filipe (Val Kilmer), a personalidade de Alexandre é bastante esmiuçada entre uma batalha e outra, em especial sua relação homossexual com o comandante de suas tropas Hephaistion (Jared Leto).
Posição complicada a de diretor de uma obra de tamanho vulto, em que a vida da figura central da trama, apesar de plenamente conhecida, é rica em nuances e detalhes que nenhum registro histórico foi capaz de captar com exatidão. Assim, além do que se conhece acerca das lendárias batalhas travadas pelo seu exército, quase nada de concreto pode-se dizer acerca da vida pessoal do rei. Esta zona cinza da vida de Alexandre é preenchida no filme pela sua relação com Hephaistion e pela visível dependência que ele tinha pela figura da mãe, seja positiva ou negativamente.
Estranhamente, este aspecto nem incomoda tanto quanto o fluxo narrativo das conquistas de Alexandre. O que incomoda mesmo são as bolhas históricas e as escolhas feitas pelo roteiro num filme que tem 'o Grande' em seu título. As primeiras campanhas do exército de Alexandre, onde antes mesmo de fazer vinte anos ele massacrou Tebas e, após a morte do pai e sua ascensão ao trono, pacificou toda a Grécia sob seu poder, são solenemente ignoradas. Com isso, a idéia de grandiosidade concebida por Stone vem somente com a batalha contra os Persas em Gaugamela, retratada com fúria e fotografia quase monocromática, da cor da areia do Oriente Médio. A seqüência é arrebatadora, mas logo deixa a tela em resposta a mais um corte insatisfatório narrado por Anthony Hopkins. E assim o filme prossegue, sem nem mesmo dar ênfase ao processo de fundação das várias cidades erigidas pelo Rei, as imponentes Alexandrias. Obcecado em chegar à borda oriental do mundo, Alexandre não assume nenhuma outra dimensão além de seu relacionamento com Hephaistion e seus escravos eunucos, seu desejo em ter um herdeiro (concretizado através do casamento com uma asiática, interpretada por Rosario Dawson) e sua idéia fixa pela dominação, que acaba por minar a confiança de seus próprios homens em si mesmo.
Uma das características de Alexandre que é bem retratada, e aparece em todas as versões históricas de sua vida, é o seu lado carismático e justo, que fazia dele um líder à frente de seu tempo. Adepto da miscigenação entre raças, o rei tratava com respeito os povos dominados. Obviamente, o filme ignora os traços mais megalomaníacos atribuídos à sua figura, como o fato de que em vida ele acreditava que era Deus, ordenando que seus súditos se curvassem diante dele. Diz-se ainda que Alexandre teve mais duas esposas, além do fato do assassinato de seu pai ter sido planejado provavelmente pelo próprio.
Como visão biográfica de tão imponente monarca, o filme de Stone fica à mercê do gosto de cada um. Como realização cinematográfica, porém, fica a meio caminho entre um épico grandioso e uma bem filmada mas algo desconexa profusão de batalhas, peregrinações e cenas em belas locações.
Texto postado por Kollision em 9/Fevereiro/2005