O arquétipo do homem seduzido por mulheres fatais, pelo menos no cinema contemporâneo, recai sobre os ombros do ator Michael Douglas, o protagonista dos distintos mas sempre com alguma fagulha de polêmica Atração Fatal (Adrian Lyne, 1987), Instinto Selvagem e Assédio Sexual (Barry Levinson, 1994). Os dois primeiros possuem uma temática mais parecida, pois são em sua essência thrillers cujo elemento crucial é uma mulher psicopata. O terceiro traz uma ameaça menos violenta, mas nem por isso menos grave. Instinto Selvagem, no entanto, foi para sempre marcado pela revelação tardia de uma sex symbol moderna, a loira fatal Sharon Stone, que antes parecia estar condenada a estrelar filmes B e ser eternamente conhecida como a coadjuvante de Richard Chamberlain nos episódios de ação toscos da série de Allan Quartermain.
Douglas é aqui um detetive da divisão de homicídios de San Francisco, que é chamado para investigar o caso de um antigo astro do rock assassinado brutalmente com um picador de gelo. A principal suspeita é a namorada do morto (Sharon Stone), bela psicóloga e escritora de romances policiais cujo último livro descrevia o assassinato exatamente como ele foi cometido. Independente, rica, bissexual, manipuladora e atrevida, ela logo arrasta o detetive num jogo de sedução, sexo e intrigas que coloca em risco tanto sua carreira policial quanto sua própria vida.
99% das pessoas que ainda não assistiram ao filme conhecem-no apenas por sua cena mais famosa: a cruzada de pernas de Sharon Stone. A atriz, sem calcinha nesta cena, foi instantaneamente alçada à categoria de símbolo sexual e experimentou uma guinada de 180 graus em sua carreira. Muitas outras cenas envolvendo erotismo, bem mais tórridas por sinal, estão espalhadas ao longo da película, algumas com a moça aparecendo em todo seu esplendor físico na tela. Não deixa de ser uma pena que o filme em si, e a atuação de Stone, sejam lembrados por alguns míseros segundos filmados numa sala fechada. É irônico também que apenas a partir deste filme ela tenha sido reconhecida em todo o mundo como algo além de um rosto bonito.
Instinto Selvagem é tecnicamente bom, com um elenco principal bem aproveitado e construção interessante de personagens. Jeanne Tripplehorn, como a psicóloga da polícia envolvida com o detetive de Douglas, também está muito bem em cena. As situações ambíguas e a teia tecida pelo roteiro nunca deixam claro quais são os motivos dos prováveis suspeitos, desenvolvendo, quebrando e mantendo o suspense com relativa eficiência até o desfecho do filme. O tal 'instinto' selvagem do detetive, aguçado como um formigueiro pela psicóloga fatal de Sharon Stone, novamente ajuda a dar uma idéia de quanto estrago uma mulher bonita pode fazer na vida de um homem. A trilha do veterano Jerry Goldsmith adiciona um toque de classe e ajuda Paul Verhoeven a compor uma obra razoavelmente intrigante, à qual não é feita a devida justiça por ela ser às vezes lembrada somente como 'aquele filme com a cena da xoxota da Sharon Stone'.
A edição em DVD da película, infelizmente, não contém um extra sequer.
Texto postado por Kollision em 21/Fevereiro/2005