Muito se fala de adaptações de histórias em quadrinhos, e muito se ignora vários longas feitos para o cinema com base nesta forma de arte muitas vezes marginalizada. Barbarella é uma criação deste meio, mais precisamente do ilustrador francês Jean-Claude Forest, um precursor dos quadrinhos de conteúdo erótico que viu sua criação se tornar um incrível sucesso de vendas ainda em 1962. Uma das melhores fantasias psicodélicas já capturadas em celulóide, o filme do diretor Roger Vadim (então marido da musa Jane Fonda) contou com a consultoria do próprio criador da HQ, resultando num deleite escapista e quase brega em seus excessos, porém pontuado por inspiradas tomadas de sua bela protagonista, seqüências deliciosamente bizarras e até mesmo tiradas humorísticas que arrancam boas gargalhadas.
Muitos anos no futuro, guerras e armas são uma coisa já esquecida, assim como o ultrapassado amor carnal. Barbarella (Jane Fonda) é uma navegadora de alta patente dentro da hierarquia espacial terrestre. Convocada pelo próprio presidente da Terra para encontrar o cientista desaparecido Duran Duran, que detém o segredo de uma super-arma de poder devastador, ela é enviada em missão ao sistema estelar de Tau Ceti, último ponto onde foi registrado um sinal do dito cujo. Durante a jornada, a heroína se depara com vários inimigos e aliados, incluindo um homem das cavernas (Ugo Tognazzi), um anjo cego (John Phillip Law), uma governante megera (Anita Pallenberg) e um ativista revolucionário (David Hemmings) até chegar a Sogo, uma cidadela decadente dominada pela luxúria.
O filme é o cartão de visita ideal para uma das mais belas atrizes da história do cinema. Estonteante, hipnotizante, enfeitiçante em seus trajes espaciais, que vão de roupas de pele a botas de cano longo brancas combinadas com um corpete justinho, Jane Fonda é a luz de um longa que tinha tudo para ser uma imensa porcaria. O desfile da atriz em meio aos cenários malucos do planeta extra-terrestre é um convite quase irrecusável ao fetiche. E reparem como ela sempre acaba perdendo alguns pedaços do traje que está usando após ser atacada por um inimigo. É quase como ver a Feiticeira do seriado Bewitched numa aventura espacial, já que o tipo físico da sra. Fonda lembra muito o de Elizabeth Montgomery. Sua cena mais famosa no filme, claro, é a dos créditos de abertura (inspiradíssimos, por sinal), onde a moça faz um strip-tease classudo em gravidade zero. Se o espectador não se apaixonar pelo menos um pouquinho por ela nesta cena, nada do universo feminino que já tenha sido mostrado numa tela de cinema será capaz de fazê-lo.
Efeitos especiais não são o forte de Barbarella. Muito menos as cenas de ação. O vôo do anjo Pygar é uma piada, assim como os combates aéreos entre a heroína e as naves inimigas de Sogo, cidade apropriadamente nomeada conforme as bíblicas e devassas Sodoma e Gomorra. Felizmente, o que falta em recursos sobra em inspiração cênica, dos figurinos baratos aos cenários inacreditáveis (o interior forrado de peles e aveludado da nave de Barbarella, o labirinto de pedra com gente congelada em posições de coito, o leito enevoado da câmara dos sonhos, a frieza colorida dos compartimentos da cidade obscena, o órgão – musical, seus pervertidos – de tortura sexual utilizado na heróina...). Dentro de suas limitações, o filme acaba por ser uma adaptação extremamente sintonizada com o seu tempo. Diversão como não se encontra mais hoje em dia, parece ficar melhor a cada revisão, e deixa a platéia com uma sensação de "quero mais" assim que os créditos sobem.
O único extra que acompanha o filme no DVD é o trailer de cinema.
Texto postado por Kollision em 2/Agosto/2006