Em muitos aspectos, Alice Não Mora Mais Aqui é uma obra atípica dentro da filmografia de Martin Scorsese. É um dos únicos filmes do diretor a trazer uma mulher em papel de protagonista, num drama suburbano que está em completa oposição à linha adotada nas obras anteriores do cineasta (Quem Bate à Minha Porta? e Caminhos Perigosos). Com o nome sugerido pela atriz Ellen Burstyn para dirigir o filme para os estúdios Warner Bros., Scorsese aceitou a tarefa e levou Burstyn a ganhar o Oscar de melhor atriz por sua interpretação.
Alice tem 35 anos, está casada com um marido apático e ausente, e tem um filho, Tommy. Ela sempre quis ser cantora, mas desistiu do sonho quando decidiu se dedicar ao casamento. Quando o marido morre ela se vê em extremas dificuldades financeiras, e lança-se numa viagem até a Califórnia para tentar recuperar a chama que existia em sua juventude. Parando nas cidades ao longo do caminho, ela tem que lutar para conseguir trabalho como cantora e garçonete, vivendo novas experiências, dividindo o tempo com o filho e descobrindo novos amores.
A estrutura do dramalhão clássico é valorizada pelas boas interpretações da maior parte do elenco, embora seja Ellen Burstyn quem praticamente carregue o filme nas costas. O iniciante Kris Kristofferson não compromete, e Harvey Keitel faz uma participação perturbadora. É óbvio que a direção sob encomenda de Scorsese imprime um certo grau de respeitabilidade mas, ainda assim, alguns taxarão o filme como um drama ordinário. Não que Alice Não Mora Mais Aqui vá arrancar lágrimas fáceis do espectador, mas é difícil não olhar para a película com aquela velha sensação de drama romântico da década de 70. A mão de Scorsese pode ser percebida nas seqüências apregoadas por trilha sonora, e nas poucas tomadas urbanas que aparecem aqui e ali. Uma das melhores reflete o sentimento de desamparo da personagem principal ao lançar-se na busca pelo seu primeiro emprego depois de anos, culminando numa sublime seqüência ao piano.
Atenção à presença da jovem Jodie Foster, em papel andrógino que engana muita gente e deixa a platéia com a pulga atrás da orelha até a última cena em que a garotinha aparece! Foster viria a trabalhar novamente com Scorsese em Taxi Driver, no polêmico papel de uma prostituta infante.
Um making-of de 20 minutos com entrevistas atuais de Ellen Burstyn e Kris Kristofferson abrilhanta a seção de extras, que traz ainda o trailer original do filme.
Texto postado por Kollision em 16/Outubro/2004